09/06/2013

MODERNICES LINGUÍSTICAS EM CIMA DA MESA

O “KNOW-HOW” DA “FAST-FOOD” A “LOW-COST”, E OUTRAS MODERNICES LINGUÍSTICAS EM CIMA DA MESA.

(Leia-se: saber como fazer comida rápida a baixo custo e outras modernices linguísticas “on the table”).



Como tenho afirmado noutros artigos deste blogue, os comentários que se seguem não sugerem, de modo algum, que sou contra quaisquer modificações que ocorrem naturalmente em todas as línguas. Estas, como todas as coisas, não são estáticas, senão ainda estaríamos a emitir uivos e guinchos como os primeiros hominídeos. Outrossim é contestar como as línguas evoluem por moda ou por submissão imperialista, como acontece agora, na maioria dos casos, com o inglês. Já aconteceu com o grego, o latim e o francês, e é preciso não esquecer que no antigo bloco de Leste, a língua russa era imposta aos países satélites.

A lista que se segue é fruto do pouco tempo que dedico a ver televisão. No entanto é suficiente para se tornar num suplício ter de ouvir e ler, até à exaustão, a repetição de palavras que quando surgem no nosso vocabulário, parecem ter entrado num aviário de papagaios. (Foi este o tema do meu artigo intitulado “Uma breve história daquilo a que chamo tradutores ignorantes e locutores/papagaios” inserido neste blogue e publicado no dia 10 de Maio de 2009.

E, como presunção e água benta cada qual toma a que quer, chamo a atenção para uma lista de disparates tirados de programas dos canais televisivos, que publiquei a 5 de Junho do mesmo ano. Nessa altura disse que iria continuar a fazer tão aliciante recolha, mas “ostras” plenas de “pérolas” desse género são tantas que perdi a pachorra. Afinal, o principal objectivo deste blogue é, como consta no título, utópico.

Mas, como seguimento dessa lista, vai aqui outra que poderia ser chamada de “modernices linguísticas”, “a subserviência à língua inglesa” ou “a psitacose, doença comum aos papagaios, que também se propaga aos humanos”.

Assim, é comum ouvir-se dizer repetidamente, por vezes até à exaustão, algumas palavras como seguem. Note-se, no entanto, que a maioria destas “modernices” não constituem erros de português, mas sim uma subserviência à língua inglesa, como demonstram as traduções literais, e as mudanças políticas influenciadas por uma certa “esquerda”que rebaixou socialmente o nome de certas profissões, não modificando em nada o trabalho necessário e honesto de cada membro da sociedade em que todos somos precisos.



Bicha – fila (no meio de tantos palavrões que hoje se dizem “à moda do Porto”, bicha é que é feio).

Notável, maravilhoso, grandioso, imponente – dramático (embora aceite pelo dicionário Houaiss, será que soa bem uma frase como “o resultado foi dramático: salvaram-se todos”).

Alcorão – Corão (trata-se de um atentado à influência da língua árabe na cultura peninsular. Quem quiser, procure a historieta que escrevi neste blogue em 1 de Março de 2009).

Ruir, cair, desmoronar, etc. – colapsar (será que os prédios passaram a ter colapsos cardíacos?)



Mãe – progenitora.

Insurrecto – insurgente.

Mortal, mortífero – letal.

Legista – forense.

Serviços secretos – serviços de inteligência (?!)

Hospedeira – assistente de bordo (parece que ser-se hospitaleiro, no sentido de receber bem, está fora de moda).

Montar programas de rádio, etc. – editar (às vezes tenho pena de já não estar na RDP para ter de editar, em vez de montar um programa. Ou será que montar implica complexos a alguns pudicos excêntricos?)

Total, geral – global.

Maciço – massivo (em cinco dicionários da língua portuguesa, não encontrei esta palavra. Talvez naqueles que, entusiástica e “patrioticamente” aderiram a mais um acordo ortográfico).

Comandante de avião, navio, etc. – capitão (quem viaja de avião, alguma vez ouviu dizer: o capitão fulano deseja boas-vindas a bordo?)

Campeonato – liga (e venha a champions).

Conjunto musical – banda (em português, uma banda é basicamente uma orquestra de instrumentos de sopro e percussão).

Criada – empregada doméstica (até parece que servir, todos fazemos ou já fizemos nas diferentes profissões, é uma vergonha).

Folheto ou prospecto que acompanha os medicamentos – bula. (lembro-me de quando a minha mãe pagava bulas à Igreja Católica para podermos comer carne, já não sei a que dias do ano. Isto já depois de três séculos após ter surgido um “herege” chamado Martinho Lutero).

Países em vias desenvolvimento – países emergentes. (estranhos países, principalmente os da África Negra, que apesar das riquezas que possuem, há muitas décadas que não conseguem sair da cepa-torta).

Aviões construídos pela firma canadiana “Bombardier” – Aviões bombardeiros a combater incêndios!!!

Climático, climatológico – climatérico. (que grande confusão entre os fenómenos atmosféricos e femininos. Mesmo depois do professor Anthymio de Azevedo ter criticado este galicismo, a “sapiência” dos chamados media é superior.

Ponto em vez de vírgula a representar números fraccionários – (espero nunca ter de passar por uma ponte em que os engenheiros não distingam, na matemática, um sinal do outro).

E… EM CIMA DA MESA (on the table)! É só ver e ouvir os telejornais. Tudo agora que está em discussão, está em cima da mesa. Até os gravadores de CD ou DVD chamam-se gravadores de mesa!

Ora como em cima de uma mesa pode fazer-se muita coisa, este termo repetido vezes sem conta “no terreno” dos chamados media, já me deu vontade de dar um murro no televisor que, como é óbvio não tem culpa das pessoas estarem a perder

uma das maiores riquezas da língua Portuguesa: a abundância de sinónimos.

Mas, aproveitando o uso e abuso das menções a esta peça de mobiliário, deu-me vontade de enunciar algumas das muitas e utilíssimas funções de tão prático e funcional móvel que o génio do homem inventou, possivelmente após aprofundados estudos de carpintaria e, quem sabe, após longas meditações metafísicas. Eis alguns dos inúmeros usos a que tão simples objecto pode prestar-se:

Comer, jogar cartas, xadrez e outros jogos de mesa, dar murros, escrever, etc. etc. etc. e até fazer amor, mesmo que o tampo seja frio como os de mármore. Com o atrito dos ritmados movimentos causados pelo dito acto, em breve este ficará quente, coisa que, aliás, não preocupa os intervenientes. Afinal, como horizontal que é, a mesa torna-se tão prática como o chão ou uma cama. É possível que haja quem já tenha feito amor (só para reprodução, claro, em cima de um piano de cauda, obtendo assim sonoridades insuspeitadas, numa orquestração que, junta aos suspiros, gritos e outros sons dos actores, fariam inveja a um Rimski-Korsakov, Stravinski ou Ravel.

Mas, para os que preferem a cópula sentada, até um piano vertical pode servir. Neste caso, a posição do que fica por baixo deve estar em cima do teclado com a tampa levantada. Que sons e ritmos espantosos não poderiam ser assim tirados, inspirando alguns génios dos chamados compositores de vanguarda que, como escreveu Sravinski em “Poética da Música”, “estão juramentados perpetuamente a exceder-se a si próprios, pretendendo que a música satisfaça o gosto pela cacofonia absurda”. Afinal, sempre há gostos para tudo, até porque muito poucos têm a coragem de dizer que “o rei vai nu”.

E, mudando de assunto e como tenho umas garrafas de cerveja EM CIMA DA MESA, vou esvaziá-las antes que a morte me surpreenda e seja cumprida a minha última vontade (registada notarialmente) de servir para estudo EM CIMA DA MESA da anatomia. Só tenho pena que entre os estudantes não possa lá estar o “Vasquinho da Anatomia”. Sabem quem foi?



P.S. Já uma vez comentei a mania do “terreno”. Que tal este título que li num dos últimos números jornal “O Correio da Manhã”, que encontrei por acaso EM CIMA DA MESA de um café?

“Polícia Judiciária no terreno (com esta palavra em vermelho!) procura pistas”.