17/12/2013

SOCORRO!

SOCORRO!
QUEM NOS SALVA DOS ECONOMISTAS?

Esta noite tive um pesadelo. Vi a troika na sua verdadeira acepção da palavra, isto é, o carro russo montado sobre esquis puxado por três cavalos. Mas, estes, para além de serem homens, não emparelhavam bem no que respeito ao aspecto físico. Um, alto e careca, tinha um ar patibular, outro a cor típica dos monhés e, o terceiro um pouco rechonchudo de estatura média. Em comum, e em vez de arreios, tinham pastas de cabedal recheadas de papeis referentes a acções, obrigações, títulos, empréstimos, câmbios, juros, tesouro, produto interno bruto, IVA (Imposto Validador das Aldrabices), IRS, IRC e todas essas trapalhadas que os economistas inventaram para complicar a vida dos outros, e entreterem-se a calcular se são precisas meia ou uma dúzia de galinhas para valerem um porco. E, o mais curioso é que raramente estão de acordo uns com os outros, o que faz com que nenhum resolve algo que se veja. Até os que ganharam o Prémio Nobel! (Quanto ao povo, ora o povo. Deus ajuda quem tem fé!)
Por seu lado, o carro estava atascado de políticos, deputados, corruptos, ladrões, militares do exército, trabalhadores com falsa baixa médica, trabalhadores em greve por “dá cá aquela palha”,  dirigentes sindicais, cronistas sociais, traficantes e todos os outros parasitas da sociedade amontoados num delirante bacanal ritmicamente marcado por guizos pendurados nas pastas e pescoços dos três tipos que puxavam aquela carripana de perdição. 
Atrás, com ar submisso de bom aluno e mão estendida, implorava, o nosso venerando, sábio e excelentíssimo Presidente da República, com a sua característica voz de asmático agora tão cavernosa que até metia dó.
Mas, para completar este cortejo dantesco, numa massa impossível de descrever, seguia a arraia-miúda de lusitanidade nascida ou malparida, agitando-se numa confusão de ritmos de fado, fandango e, principalmente, de chulas. À sua frente marchava, solene e altaneiro, um chefe. Mas, não era a espada de D. Afonso Henriques que ele empunhava. Autêntica cópia da figura do Zé-Povinho, tal como Rafael Bordado Pinheiro criou, fazia aquele gesto tão gracioso que, por vezes, provoca mais efeito do que as mãos postas em frente da estátua da chamada Virgem Maria que, passados quase dois mil anos, ressuscitou e apareceu em Fátima num tipo de nuvem desconhecido dos meteorologistas. As suas emanações pestíferas mataram uma pobre azinheira mas, em compensação, continuam a fazer entrar muito dinheiro que, despois de analisado pelos economistas, os políticos distribuem com a sua costumada imparcialidade.
E, todo aquele abençoado povo, descendente de santos e heróis, para não destoar dos puxadores da troika, arrastava consigo barris que, em vez de carrascão, estavam também cheios de papeis. Estes, porém, tinham nomes diferentes, tais como, dívida soberana, dívida pública, dívida externa, dívida bancária, dívida à farmácia, dívida à mercearia, dívida ao chulo, enfim, dívidas de todos os tipos e para todos os gostos.
Entretanto, a minha bexiga a abarrotar da santa e omnipresente cerveja, deu sinal de alarme. Mal-humorado por ter de sair do quentinho, e, depois de cumprida a missão de aliviar aquele órgão do seu conteúdo exagerado, voltei a deitar-me. Pus-me de barriga para cima, posição em que costumo entrar nas minhas meditações metafísicas, e a música das finanças começa a martelar-me, de novo a cabeça, desta vez acordado: acções, obrigações, juros, tesouro, dívida pública, dívida soberana, dívida externa, produto interno bruto, etc. etc.
Enquanto isto soava dentro da minha pobre cabeça, comecei a sentir uns estranhos formigueiros pelo corpo. As coisas começaram a baralhar-se mais até que me fixei no chamado produto interno bruto.  A brutalidade deste termo, obrigou-me a por instintivamente a mão numa zona delicada do corpo, como que para a proteger. Sem perceber porquê, lembrei-me ao mesmo tempo do gesto do Zé-Povinho!
Perto do delírio comecei a ver notas de banco a voar, o chamado papel-moeda. Mas, se é papel, não pode ser moeda, pensei. E, se pode, porque não há de haver moeda-papel?
E o ouro, esse elemento metálico que tem mais valor do que os outros, embora haja muitos mais raros! Com as “injeções” de Mandela que os telejornais, lembrei-me que a África do Sul está cheia dele, mas está longe de ser um país rico. Pela minha parte prefiro uma boa feijoada, já que o ouro deve ser muito indigesto. E até perde alguma graça pelo facto de não provocar gases. Por outro lado os países árabes estão ricos graças ao petróleo, crude, brent, ouro negro ou como lhe quiserem chamar. Pelo menos, em termos do número de nomes, vale mais que o ouro amarelo, embora também deva ser terrivelmente indigesto.
Tentei acalmar-me mas não consegui, pelo que resolvi tomar um ansiolítico. Mas, enquanto não fazia efeito, apeteceu-me gritar: acções, obrigações, títulos, câmbios, juros, empréstimos, dívida pública, dívida soberana, divida isto ou aquilo, cifrões, milhões, biliões de cifrões, o Produto Interno Bruto e…aaaa!!! Tive de correr para a casa de banho, e, com uma tremenda explosão, livrei-me daquele famigerado produto! Nem queria acreditar, mas era verdade!
Muito mais aliviado, voltei para o “quentinho” e deitei-me de barriga para baixo como é meu hábito.  Afinal é melhor pensar que tudo isto não passou de um disparatado pesadelo num mundo disparatado, originado pelas lavagens ao cérebro que são os malditos telejornais. Vou deixar de os ver porque a paciência tem limites. É uma utopia, bem sei, mas o melhor é pensar e sonhar que a realidade é outra.
Para mim, e dentro do possível, é muito mais interessante e aprazível saber quando chega a Primavera!