12/04/2014

A PROPAGANDA DE UM POLÍTICO NA VARANDA, E A POPULAÇA APLAUDINDO NA PRAÇA

“Não discutimos Deus e a Virtude, não discutimos a Pátria e a sua História, não discutimos a Autoridade e o seu Prestígio, não discutimos a Família e a sua Moral, não discutimos a glória do Trabalho e o seu Dever, mas, se algum de vós me quiser seguir…”
Todos, gritava a populaça na praça respondendo à voz de falsete de Salazar a que não faltava o característico sibilar de quase todos que andaram no Seminário.

“Nicht für uns, alles für Deutschland”, berrava histericamente Hitler acompanhando a frase com os seus dotes teatrais adquiridos em frente de um espelho.

“Heil Hitler, über alles, Sieg Heil”, ululava a populaça na praça estendendo o braço em saudação à glória do seu “Führer”, da Alemanha e do seu povo. E porque não? O terceiro “Reich” iria durar mil anos.

“Liberté, égalité, fraternité” proclamava a populaça na praça antes de iniciar a matança que deu origem ao Terror.

Em 1940, Mussolini na varanda anunciava a sua resolução de meter a Itália na guerra do lado dos Alemães, e a populaça na praça, em vez de gritar “un corno”, aplaudia maravilhada, como se fosse aquele palhaço a ir combater.

E Estaline, e Mao-Tsé-Tung, e Hiroito, e…fico por aqui, porque destes espertalhões, esteve, está e estará a História sempre cheia. E apenas estou a referir-me a alguns destes espécimes que infectaram o século passado. Se fosse possível nomeá-los a todos, não haveria memória de computadores que chegasse. Mas, de quem é a culpa? Deles? De modo algum; a culpa é da populaça que acredita nesta espécie de gente.
É a fartura, a paz, a liberdade para todos os homens de boa (ou má) vontade por todos os séculos dos séculos, ámen.
“Sou eu quem vai endireitar o país e o mundo. Construir o homem novo, organizar a sociedade sem classes, acabar com a exploração do homem pelo homem, a paz para todo o sempre”.

E a populaça eufórica mas ignorante, necessitando sempre de um chefe (nem que seja de cozinha) e, acreditando como é seu hábito, nas palavras dos políticos, berra, dá vivas e morras, estende o braço de mão aberta ou de punho fechado, esfrega-se digital ou manualmente conforme o sexo e fica feliz, radiante, eufórica porque, finalmente chegou o fim de todos os seus problemas. “Com este é que vai ser bom. Vamos pagar menos impostos, ter aumento de ordenado, comer mariscos todos os dias, comprar automóvel novo de rabinho alçado para mostrar aos vizinhos, computadores e telemóveis última moda, ter uma casa com piscina e cores garridas, frequentar festarolas com vestidos espampanantes para aparecer naquelas revistas onde só tem cabimento aquela gentalha dita importante, fazer cirurgias plásticas “à moda de Caneças” para esconder a velhice, trabalhar o menos possível, adoecer quando nos apetecer para aproveitar a baixa como segundas férias nas Caraíbas por indicação do médico, e todas essas coisas básicas para podermos viver decentemente”.

E o político na varanda, promete o reino da fartura à populaça que o aplaude na praça, já esquecida das promessas do espertalhão anterior. Mas não é só na varanda. É no terreno, como agora se diz, que o político faz as promessas da luta final. Vai às cidades, vilas e aldeias, escolhendo os locais de que mais gosta, como as feiras, ou por necessidade imperiosa, as retretes públicas onde desabafa toda a sua sede de poder.
Dá abraços e apertos de mão a todos os que, entusiasmados, caem na esparrela de o aplaudir. Nem as crianças escapam aos seus “beijos de Judas” e, como crianças que são, aplaudem como fazem a qualquer palhaço por muita ou pouca graça que tenha.
E, como é óbvio, em vez de se abster, a populaça vai votar para oferecer ao político o “tacho” que lhe permitirá desafiar a lei da gravidade, isto é, cair sempre para cima quer roube muito ou pouco. Afinal para que é que alguém se mete na política? Salvo raríssimas excepções, toda a gente sabe porquê, mas vota!
Pouco tempo depois a populaça volta à praça mas, desta vez o político não aparece na varanda. Surge na televisão (sempre é mais seguro) e justifica o incumprimento das suas promessas com a ignorância da pesada herança que recebera do governante anterior. Esse sim, é que deu cabo do país, dos trabalhadores e dos reformados.
E enquanto ri interiormente porque sabe que, aconteça o que acontecer, o seu futuro está garantido, tenta justificar que as medidas de austeridade são provisórias. Para ele e os seus acólitos, é claro.

Mais uma vez, frustrada e enganada por sua própria culpa, a populaça volta à praça, mesmo sem o político na varanda. Grita, apupa tudo e todos, tenta invadir o chamado Parlamento onde enriquecem os “representantes” do povo, e desata a cantar, desafinadamente, a já fora de moda “Grândola, Vila Morena”, virando o disco para afirmar a estafada utopia que diz que “o povo unido jamais será vencido”.

Para terminar a grandiosa manifestação de massas, das classes trabalhadoras, da Função Pública e dos pensionistas, vem o momento solene para entoar (também desafinado) o Hino Nacional.
Como ninguém lhes liga nenhuma, até porque a Polícia está lá para evitar desacatos, travam-se interessantes diálogos, um dos quais poderia ser este:

-Olhe que não é “igrégios”; é egrégios.
-Desculpe, mas os meus avós foram sempre à igreja
-Eu logo vi! É por causa dos seus avós, e de todos os lacaios da padralhada, que o País está como está.
-Já vi que vossemecê não acredita em Deus.
-Claro que não. Sou ateu.
-Não se preocupe com isso. Há quem tenha alcunhas piores. E quanto a nomes, ainda ontem um automobilista me chamou cabrão.
-E o que é que lhe respondeu?
-Ora! Que isso não era comigo, mas sim com a minha mulher.
-O quê? Você aceita que lhe chamem cabrão como se a sua mulher fosse uma puta?
-E, como posso saber se é ou não? Apenas por descargo de consciência e quando chego a casa c’os copos, dou-lhe uns enxertos de porrada para desabafar. Mas, cuidado, meu caro senhor; não admito que chamem puta à minha mulher. Se eu dissesse o mesmo da sua mãe, gostaria?
-Partia-lhe os cornos, sua besta!
Entra em cena um terceiro manifestante.
-Calma amigos. Estamos aqui para exigir o cumprimento dos nossos direitos, e não para tratar de questões de família. Lembrem-se que o povo unido jamais será vencido!
-Tem razão, diz um dos dois agastados. Mas o problema é que ninguém nos ouve e ainda arranjo uma cãibra à força de tanto gesticular. Por isso tenho de discutir com alguém. Mas ainda bem que falou de “cãibras” Lembrou bem; Também devíamos exigir que as “cãibras” municipais sejam dirigidas apenas pelo povo.
-Para isso é necessária a “dentadura do pretolariado”.
- Nem pense; já cá temos pretos que cheguem.
-Seu racista de merda; ao menos eles têm os dentes mais brancos do que nós. E não usam nenhum detergente, daqueles que lavam sempre mais branco.
-Isso é do contraste com a cor da pele. Já vi que você julga que todos somos iguais. Se fosse assim não havia inteligentes e estúpidos como você. E isto acontece em todas as etnias. E digo etnias porque agora é proibido dizer raça. Se a censura da democracia continua como está, ainda temos de dizer “etnista”.
-Porra que você agora, além de se armar em esperto, também julga que é sábio e inteligente. Porque não vai para a política ou para presidente de um clube de futebol, seu reaccionário? E a propósito: É do Sporting ou do Benfica?
-Sou do Porto, carago! A única cidade deste País onde se trabalha!
-Isso é uma mania que vocês têm, os lá da chamada “invicta”. Mas Lisboa é que é a capital do país, coisa que lhes provoca uma grande dor de corno.
-E uma grande dor nos tomates se continua a insultar as gentes do Norte.
-Mas ao menos, temo-los sítio. E muito bem blindados.
-Você não passa de um reles “fachista”. Já que é tão valentão, veja lá se é capaz de estender o braço direito à maneira dos nazis.
-Essa de julgar que foram aqueles tipos que inventaram aquele gesto, é de cabo de esquadra; já os Romanos faziam o mesmo quando saudavam alguém. E como sou um homem de “coltura”, sei que diziam AVÉ ao mesmo tempo. Será que agora é proibido dizer “Avé-Maria”?
-Lá vem, outra vez, a porra da religião. Você também acredita que Deus dá o frio conforme a roupa? Pela minha parte acho que faria melhor em dar a roupa conforme o frio.
-Quero lá saber disso; já lhe disse que sou ateu. Porque não vai expor esse argumento ao padreca lá do seu sítio? Seria divertido ver o tipo a pregar isso na igreja. À saída davam-lhe uma sova, à falta de uma fogueira.
Outro manifestante interrompe tão interessante diálogo:
-Irra! Vocês nunca mais acabam com isso? Afinal o que vieram aqui fazer?
-É este “fachista” de merda que me está a provocar. Foi ele que começou. Se eu mandasse enviava-o para a Sibéria para saber como é.
-Cala-te, “comuna” de merda. Não passas de um “fachista de esquerda e foste tu quem começou. Vai fechar o punho em nome do Estaline, esse comparsa do Hitler. Se eu mandasse, ias já para Caxias.

Palavra puxa palavra, empurrão daqui e de acolá, em breve os dois representantes do povo unido, em que ficámos sem saber a que partido ou crendice pertenciam, chegaram a vias de facto. Enquanto uns os incitavam em nome da política, outros tentavam separá-los por via da mesma.
Finalmente, tudo serenou, Após umas bastonadas da política da polícia, a praça ficou vazia, enquanto para lá da varanda ninguém bulira.
Só tempos depois, nas eleições seguintes, outro político voltou à varanda. E a mesma populaça na praça, como sempre crédula e ignorante, aplaudiu entusiasmada.

Conceito: O POVO UNIDO CONTINUA E CONTINUARÁ A SER VENCIDO!

Depois de ter escrito esta historieta para me divertir, ocorreu-me fazer um comentário sobre o seu conteúdo. Afinal, se o povo continua (e continuará) a ser vencido, no meu modo de ver talvez pessimista, pareceu-me oportuno fazer uma pequena resenha histórica do passado.
Ficará, assim, completada a trilogia: passado, presente e futuro.
Será este o tema do próximo artigo. Cruel, divertido, ou ambas as coisas?
Uma única certeza: será inútil, mas ajudará a aliviar as minhas ‘iscas’ já bastante abaladas após setenta e um anos neste disparatado (e famigerado) planeta!

Obs: não sei quando farei o comentário. Como disse num artigo anterior, tenho andado ocupado (quando me apetece) a escrever a história da minha ida à Guerra Colonial. Vou a caminho das cem páginas, e ainda não cheguei à partida para Angola.
Se conseguir acabá-la, é pouco provável que a publique neste blogue. Iria incomodar algumas pessoas, principalmente militares e anti-racistas primários. Mas, quem sabe? Por enquanto penso mandar fazer uma edição privada para a família e amigos. O futuro dirá.

Nota: Qualquer comentário escrito conforme o chamado 'novo acordo ortográfico' será considerado como contendo erros grosseiros e, como tal, corrigido!