02/12/2010

O DISPARATE DO “PUM-TCHI-PUM”

OU "AO QUE TU CHEGASTE, MÚSICA".
           (1ª parte)

Pum-tchi-pum-tchi-pum-tchi-pum. Parará-tchi-pum-pararáthci-tchi-pum. Pum-pum-pum-pum-pum - (Mais alto! Puxem pela artilharia dos amplificadores e apontem bem os altifalantes com o máximo de decibéis e infra-sons)
PUM-PUM-PUM-TCHICRAQUE!!!CATAPUMPUMPUM………


E “PRONTOS”! Rebentaram as colunas sonoras, os amplificadores, as vidraças e… os tímpanos de quem ainda não está surdo! Eis a chamada música ligeira de hoje (salvo as excepções, como é óbvio).

Maravilha das maravilhas. Estamos dentro de casa e, de repente, as vidraças começam a vibrar porque, lá fora, um tipo que deve ser surdo conduz um carro disparando “decibéis” a torto e a direito. Ou, se ainda não é surdo, para lá caminha, quanto mais não seja para mostrar aos outros que a sua aparelhagem é a melhor, ou seja, a mais potente do que a dos outros já que, possivelmente, a potência lhe falta nalgum ponto mais importante.
Mas a maravilha acústica continua. Saímos para a rua e somos bombardeados com o ruído das motoretas e automóveis com os tubos de escape propositadamente rotos, conduzidas no primeiro caso por garotos que querem mais velocidade do que a pobre bicicleta motorizada pode dar e, no segundo, por um certo tipo de cidadãos que necessita ouvir o motor a fim de perceber que a carripana está a andar ou, o que é pior, afirmar a sua personalidade. Normalmente são esses tipos (curiosamente todos machos) que põem todas as nossas pilosidades em pé com os guinchos estridentes de pneus a derrapar no asfalto, seja por arranques ou por travagens escusadas. E ainda dizem que a gasolina e os pneus estão caros. É a crise!
E os meninos das moto-4 com escape também roto, gentil oferta dos paizinhos tornados novos-ricos nascidos após o 25 de Abril e oferecidas como prémio às suas geniais crias por terem passado de ano com um fantástico medíocre. E os agentes da autoridade de costas, fingindo não ouvir a chinfrineira, terem de pregar uma boa multa conforme manda a Lei, e ouvir depois um raspanete do chefe com a frase clássica: você está louco? Não sabe quem é o pai do garoto que multou?
E continuando com o rol de decibéis ainda muito incompleto, entramos num supermercado (perdão, num shopping) e ela lá está, a chamada música do “pum-tchi-pum” ou do “parará-tchi-pum” a matraquear-nos os ouvidos no meio do vozear da multidão obstinada em gastar o que tem e não tem, comprando produtos inúteis e que, às vezes, até não sabe para que servem. Mas não faz mal; enquanto os Bancos emprestarem uns cobres para todos os desvarios, a vida continua apesar da “crise”. Então não é ao Estado (e não a nós?!) que compete pagar o que importamos? Até parece que há muita gente que julga que os produtos alimentares já nascem enlatados nos supermercados, pelo que deveriam estar ao preço da uva mijona. Abaixo os agricultores! Viva o admirável mundo novo!
Depois é ir ao parque de estacionamento subterrâneo procurar o carro que já não sabemos onde deixámos, mas não faz mal: até aí o “pum-tchi-pum” nos acarinha como um bálsamo activador de memória, sossegando-nos com o velho ditado de 'quem procura sempre alcança'.
No tempo de praia, nos barracões com esplanadas improvisadas, pintados com as mais vetustas cores e 'imperiais' a quatro euros para atrair turistas, somos atingidos por chutos e pontapés de todo o tipo, enquanto, por debaixo das ondas que fazem rolar as pedras, submarinos U-2, no valor de milhões de euros, espreitam o momento de dar o golpe final nos nossos esfrangalhados tímpanos. Já nem podemos conversar. Abrir a boca é só para berrar pelo atrapalhado empregado de ocasião, normalmente brasileiro, e pedir que nos traga alguma coisa para engolir, sólida ou líquida, tanto faz, para usarmos a boca numa das suas várias funções. Mas fica a dúvida se poderemos engolir, já que o estômago vibra que nem um possesso ao ritmo dos infra-sons do “pum-tchi-pum”. Por isso, e perante a dúvida de termos de ir ao vomitorium para não ficarmos com soluços, levantamo-nos e vamo-nos embora. Isto, claro, pela parte que me respeita. Mas, justiça seja feita, encontrei uma esplanada nas praias da Costa de Caparica (deve ser a única na zona), onde podemos conversar, comer e beber em sossego, ouvindo o marulhar das ondas e ver os bandos de gaivotas que recolhem ao pôr-do-sol. Felizmente há sempre uma excepção que, normalmente, confirma a pobreza de espírito da maioria da populaça, já que coloca a 'cultura de massas' (como lhe chamam os pândegos da chamada extrema-esquerda) sob a divina graça de uma das chamadas bem-aventuranças atribuídas ou, à falta de melhor, a Jesus Cristo. No fim de contas trata-se de um meio infalível para entrar no Reino dos Céus.
Mas deixemos o sarcasmo e falemos mais seriamente.
Não porque o que atrás foi dito seja mentira, mas simplesmente porque gosto de ver as coisas muito claras e bem explicadas, para além de, modéstia aparte, julgar possuir alguma autoridade sobre o assunto. Por isso vou impingir um breve resumo da minha vida musical. Mas isso fica para a segunda parte deste artigo.


26/11/2010

JOÃO PAULO II NÃO ERA LÚCIDO

JOÃO PAULO II NÃO ERA LÚCIDO
E O CARDEAL ALFONSO TRUJILLO ERA MENTIROSO!

Maravilhoso mundo de coincidências! Na altura em que estou a ler o livro de Christopher Hitchens “Deus não é Grande” (como a religião envenena tudo), aparece o Senhor Cardeal Joseph Alois Ratzinger, vulgo Bento XVI, Papa, Sumo Pontífice, Santo Padre, etc., a permitir o uso de preservativos “em certas condições?!" quanto mais não seja para dar maior estímulo aos fabricantes no que respeita a cores, sabores e demais decorações com que esse pedaço de látex pode ser mimoseado. Principalmente quando se trata de um apetrecho que tem a honra de gerar tanta controvérsia e até ser um dedicado amigo da deusa Vénus no que respeita a vestuário. Pena é que o planeta que porta o seu nome não possa ser explorado por astronautas devido às terríveis condições que lá existem. Assim esperamos apenas que um dia sejam importadas gravatas de Marte, já que camisas do outro são impossíveis.
Vem o título deste texto a propósito da declaração do padre Manuel Morujão, da Conferência Episcopal Portuguesa, a quem já aludi neste blogue a propósito do programa “Prós e Contras” dedicado à visita do Papa a Portugal.
Segundo aquele iminente prelado, Bento XVI ao fazer tal concessão, mostra a sua grande lucidez. Logo, das duas uma: ou João Paulo II não era lúcido, e por isso andou a propagar indirectamente a SIDA por este ditoso planeta, ou então fê-lo de propósito, já que para as religiões o mais importante é manter a fé cega dos crentes, por maiores males que daí advenham.
E quanto ao cardeal Alfonso López Trujillo, Presidente do Conselho Pontifício para a Família (pela minha parte não lhe passei nenhuma procuração) que declarou peremptoriamente que os preservativos tinham buracos microscópicos por onde os vírus passavam? Pois é verdade. Ouvi esse senhor, genial obra da criação do deus dele, fazer essa afirmação num programa televisivo, facto que é mencionado no livro de Christopher Hitchens e cuja leitura aconselho vivamente. Mas para quê fazê-lo quando a maioria dos crentes faz como a avestruz ou, melhor dizendo, imitam aqueles que se recusaram a espreitar pelo telescópio de Galileu, com receio de ver que, na verdade, o planeta Júpiter com os seus satélites constitui outro sistema planetário? O espantoso é que esse facto se deu há quatrocentos anos, e hoje continua a haver gente com a mesma mentalidade. Será por medo do Inferno? Mas o anterior Papa acabou com ele, colocando assim o Diabo e respectivos funcionários no desemprego. É a crise!
Se o autor de “Deus não é Grande” fosse português, viriam logo os dois actuais Grandes Inquisidores, que dão pelos nomes de Sousa Lara e Mário David, pedir no mínimo, que mudasse de nacionalidade, já que o tempo das fogueiras é na época festiva dos Santos Populares, e as leis já não permitem churrascos de seres humanos, de preferência vivos, para desgosto de muitos católicos.
Mas a esses dois patuscos senhores já me referi quando escrevi dois longos textos sobre “Caim” de José Saramago. De resto são personagens tão pequeninas perante o genial escritor, que nem merecem qualquer citação, não fosse a cegueira voluntária que manifestam.
No entanto, em todas as polémicas aparecem sempre alguns moderados, espertalhões e com sentido de humor. Foi o caso do padre Carreira das Neves quando afirmou, a propósito do livro “Caim”, que Saramago “inventa, cria e tem direito a isso, porque se o autor é romancista tem direito à ficção”. Depois esclarece que a obra o “encanta porque é uma sátira”. Dou-lhe os mais sinceros parabéns. Muitas vezes a esperteza supera a inteligência. Foi isto que faltou a João Paulo e a Alfonso Trujillo.
E agora vou continuar a ler o aludido livro. Ainda vou no meio, mas confesso que já me provocou o riso mas também vontade de chorar. Porque, às vezes, ter contacto com a realidade nua e crua, transforma-se numa tragicomédia para quem procura manter uma certa lucidez e ver o mundo tal como é, muito longe das “maravilhas” apregoadas por fanáticos para iludir a populaça ignorante e manter a clientela em seu proveito, por mais absurdas que sejam as suas palavras e actos. As tragédias que as religiões provocaram e provocam, superam de tal maneira a comédia, que também esta acaba por se transformar num vale de lágrimas.
E fico por aqui.
Apesar de muitas vezes “andar nas nuvens”, digo como Fernando Pessoa: MERDA, SOU LÚCIDO!



08/09/2010

ASTRONOMIA e CARL SAGAN.

ASTROLOGIA e a CRENDICE HUMANA.


COSMOS e… O CAOS DAS TRADUÇÕES!


Há dias resolvi voltar a ver essa espectacular série documental feita pelo astrónomo norte-americano Carl Sagan tão precocemente falecido, vítima de uma rara variedade de cancro, a mielodisplasia. A sua maneira de explicar as coisas, o seu talento como apresentador e o inato sentido pedagógico fizeram-me recordar Leonard Bernstein, essa extraordinária metamorfose humana da Música, e os seus “Concertos para Jovens”.

Entre as várias interrogações que se me puseram, e não foram poucas, começarei por uma mais terra a terra, como se costuma dizer: O que é que a maioria das pessoas que frequentaram o ensino liceal andaram lá a fazer? Bem sei que é impossível recordarmo-nos de tudo o que aprendemos mas, desde criança que me interrogo sobre as por vezes disparatadas respostas que obtinha às minhas chatas dúvidas. E digo chatas porque naqueles tempos as perguntas de uma criança tinham muitas probabilidades de ter como resposta coisas do género " não sei”, “pergunta ao teu pai”, o menino ainda não tem idade para compreender essas coisas” e outras “maravilhas” similares. É claro que nem me passava pela cabeça fazer perguntas sobre sexo. Deus (ou o Diabo, digo hoje) me livrassem de tal coisa! Muito menos também manifestar dúvidas quanto à existência do primeiro, até porque os ensinamentos dos catequistas e dos padres eram inquestionáveis. Um desses senhores, que fui obrigado a aturar, à minha pergunta como é que as chamas do Inferno queimavam eternamente sem consumir, respondeu que era um tipo de fogo que queima mas não consome. E o assunto ficou resolvido! Até parecia (e hoje ainda parece) que esses donos das verdades deles, que se autoproclamam representantes de Deus na Terra, tudo sabem, cumprem e têm o dever de fazer cumprir. Mas não será isso uma espécie de comichão sadomasoquista que os obriga a contagiar os não crentes como uma praga de sarna? De qualquer modo, e que eu saiba, nunca nenhum deles apresentou as suas credenciais autenticadas por Deus autorizando o alastramento da epidemia.
Ora como tive sempre uma grande curiosidade, sobretudo por geografia, astronomia, meteorologia, história universal e ciências físico-químicas, mais virado para as ciências do que para as letras, devorava todos os dicionários, atlas e enciclopédias que, felizmente, havia na casa de meus pais, que tinham estudos muito superiores à média dos portugueses desse tempo. Também as pessoas das suas relações faziam parte desse restrito grupo de eleitos, sendo muitos deles licenciados, principalmente em medicina e engenharia. Nesse tempo, fins dos anos cinquenta, fui classificado pelos oficiais do navio “Carvalho Araújo”, no qual visitei a Madeira e os Açores onde assisti à erupção do Vulcão dos Capelinhos na ilha do Faial, como “filósofo, poeta e cientista”. Hoje, porém, e sem falsa modéstia, julgo que era apenas um chato e um pretensioso com a mania de saber tudo.
Mas, apesar disso vou dar alguns exemplos muito antigos que ainda hoje me põem perplexo e que justifica a pergunta atrás feita: o que é que as pessoas andaram (ou andam) a fazer no liceu?
Desde criança e até ter sido obrigado a fazer o serviço militar obrigatório (!), com a consequente ida para Angola fazer figura de parvo, passava com a minha família as chamadas férias grandes em Oeiras. Seguindo a paixão pela praia herdada de meu pai, olhava, extasiado, os grandes navios que cumpriam os calendários que as rotas marítimas impunham na época, já que viajar de avião era quase uma aventura que metia medo (e ainda hoje mete a muita gente não sei porquê). Assim, ante os meus olhos, entravam e saíam a barra do Tejo dezenas de “gigantes dos mares”, entre os quais cito apenas o italiano “Saturnia”, (engraçada coincidência com o meu apelido) do qual possuo um prospecto publicitário dos anos trinta, herdado do meu avô paterno que era médico na estação marítima da Rocha do Conde de Óbidos em Lisboa. Nessa época, quando um navio chegava, o médico do porto ia numa lancha a bordo informar-se perante o colega embarcado, se havia algum caso de doença contagiosa. Em caso afirmativo era içada a bandeira preta e amarela, e o navio era mantido ao largo de quarentena, palavra usada a partir de 1403 por determinação do Governo de Veneza e que interditava a atracagem antes de se completarem quarenta dias. Ainda hoje o preto e o amarelo avisam que um veículo transporta carga perigosa, enquanto a Natureza dotou algumas rãs com os mesmos tons, alertando assim os predadores para o facto de serem venenosas.
Ora uma vez, quando passava em frente da praia um desses navios, ouvi um amigo do meu pai comentar: é espantoso como um monstro daqueles, feito de ferro, consegue flutuar.
Admirado com o espanto daquele respeitável senhor, comentei para mim próprio: mas
Arquimedes, há mais de dois mil anos, explicou a lei da impulsão bem como a respectiva equação que a determina: I=VD, ou seja, qualquer corpo mergulhado num líquido (ou em qualquer outro fluido) recebe deste uma impulsão debaixo para cima igual à densidade do líquido multiplicado pelo volume do líquido deslocado por esse corpo. Reza a lenda que o grande geómetra e matemático grego, descobriu aquela lei da Física quando se encontrava no banho. Entusiasmado com o seu achado esqueceu-se que estava nu, e correu assim pelas ruas de Atenas, gritando: Eureka! Eureka! (Achei! Achei!)
Na mesma praia, também frequentada pelo meu médico pediatra, parente afastado, ouviu-o “receitar o remédio” para tirar o cerúmen dos ouvidos: deitar álcool dentro deles já que este evaporava-se rapidamente levando consigo a também chamada cera.
Mais uma vez a minha jovem cabeça entrava em curto-circuito, talvez porque algum recôndito neurónio dizia-me: quando um líquido se evapora, deixa tudo o que tem dissolvido como resíduo. É assim, por exemplo, que se extrai o sal da água do mar!
Também nesses já longínquos tempos ouvira alguém dizer que a terra girava sobre si própria várias vezes por segundo. Ora se isso fosse verdade, teríamos uma alternância vertiginosa dos dias e das noites, sem contar com a força centrífuga que faria saltar tudo e todos para fora da Terra, força essa que seria máxima no equador.
Mais recentemente, vai para 10 anos, ouvi na RTP- 2, um rapazola com uma espécie de tacho na cabeça (imagem de marca) afirmar que um professor lhe ensinara que "o preto é a reunião de todas as cores"! Isto veio a propósito de um debate sobre racismo. Na ânsia de utilizar o politicamente correcto contra a realidade dos factos, porque todos nós, seja qual for a etnia, somos racistas em maior ou menor grau, levou esse pateta a inverter a realidade da Física. Ou então foi mal ensinado ou aprendeu mal. Mas para que lhe serviam os miolos que tinha debaixo daquela espécie de tacho? Não me lembro do nome dele. Fixei apenas que era açoriano e pareceu-me tê-lo visto há pouco tempo, de relance, num dos canais da RTP. Julgo que era ele graças à sua imagem de marca.
E poderia continuar a referir mais disparates provenientes de pessoas que, no mínimo de habilitações, tinham o curso completo dos liceus.
É claro que ninguém pode lembrar-se de tudo o que aprendeu. Longe disso. A propósito, aproveito para citar a velha máxima dos cábulas: “quanto mais estudamos, mais aprendemos; quanto mais aprendemos, mais sabemos; quanto mais sabemos, mais esquecemos; quanto mais esquecemos, menos sabemos. Para quê, então, estudar?
Ou a dos deterministas: “se está escrito que hei-de ser um grande filósofo, então serei um grande filósofo; se está escrito que nunca hei-de ser um grande filósofo, então nunca serei um grande filósofo. Logo, não vale a pena estudar.
É claro que tanto aquela máxima como este dilema pecam por exagero. Mas, analisando com pragmatismo pelo menos a primeira, temos de confessar que, em certa medida, não está longe da realidade. Por isso chego a interrogar-me se, de facto, é necessário estudar coisas que, mais tarde, não vamos precisar no desempenho das nossas profissões ou que, pelo menos, não nos despertem interesse. Porque é que um médico terá de se lembrar do teorema de Tales ou da lei de Ohm se, a todo o momento, tem que estudar os avanços da medicina? Francamente, não encontro resposta, porque a cultura geral, que sempre defendi e defendo, encontra-se entre fronteiras tão indefinidas que é impossível fazer…a definição! Mas a verdade é que a Ciência avança a uma tal velocidade que torna impossível o cérebro humano tudo apreender. Longe vai o sincretismo filosófico inicial, que reunia na Antiguidade toda a sapiência dos homens. Mas, para compensar, temos os computadores, onde podemos procurar coisas que esquecemos ou ignoramos.
Mas voltemo ao primeiro tema do título deste blogue: Astronomia e Carl Sagan. Seria impossível mencionar aqui todas as maravilhas dessa ciência, hoje mais desenvolvida devido ao telescópio Hubble, que “vê” o universo sem as perturbações da atmosfera terrestre. Ciência do passado, nascida da fantasiosa astrologia em que ainda hoje muita gente acredita, ela continua a ser do passado, já que tudo o que nos é mostrado pelos diversos instrumentos, provem sempre com o atraso motivado pela invariável velocidade da luz, cerca de 300.000 km. por segundo. Assim, a luz do sol leva quase oito minutos a chegar à Terra, enquanto muitas galáxias são vistas como eram há milhões de anos! Talvez até já não existam. Contudo, e isso é que é importante, é que o número de estrelas calculadas no total das galáxias conhecidas é de dez elevado a sessenta, ou seja, um número formado por sessenta algarismos, mais do que a soma dos grãos de areia de todas as praias da Terra! Mesmo considerando que nem todas as estrelas tenham planetas gravitando à sua volta, a probabilidade da existência destes ainda continua gigantesca. E depois continuam a pretender que só a Terra é habitada e que o mundo que apenas vemos à vista desarmada foi criado pelo Deus da Bíblia, no qual se centra o “Povo Eleito” e a chamada “Terra Prometida”. Como alguém disse, seria um enorme desperdício. E eu acrescento: quão ínfima é a inteligência da esmagadora maioria dos seres humanos que, depois das descobertas astronómicas dos últimos séculos, ainda se encontra tão limitada.
Quem sabe, por exemplo, que houve um pândego de um arcebispo americano chamado James Ussher de Armagh que chegou à "conclusão" que a Terra tinha sido criada por Deus num sábado, 22 de outubro de 2004 a.C., às seis horas da tarde? E que essa data foi sancionada na década de 30 do século XX por um secretário de estado do Partido Democrata norte-americano?
Pela minha parte tive de aturar um colega "Testemunha de Jeová" que, baseado nessa data, ele e os da sua seita previram o fim do mundo (da Terra) para 1973. Apostei com ele que tal não sucederia e, passado esse ano, perante o meu irónico comentário, meteu os pés pelas mãos, justificando a falha como um erro de cálculo. Assim, esse Apocalipse não foi now e foi adiado para 2003. Nunca mais soube desse colega, mas já vamos em 2010. É caso para dizer: que raio de matemáticos possui aquela religião que anuncia o fim do mundo ao qual chama "a boa nova"!
Sem querer, como é óbvio, fazer uma história da astronomia, posso fazer um simples resumo: durante milénios o homem julgou que a Terra era quadrada (daí a frase os quatro cantos do mundo) e que todos os astros giravam à volta dela. Saltando por cima da Grécia Antiga, onde Eratóstenes referiu a esfericidade do nosso planeta, assunto a que já me referi noutro artigo, chegamos ao Renascimento no qual o polaco Nicolau Copérnico e o italiano Galileu Galilei confirmaram o sistema heliocêntrico. A invenção do telescópio, atribuída entre vários nomes ao holandês Hans Lippershey, permitiu a Galileu a descoberta dos quatro maiores satélites de Júpiter, Io, Ganimede, Calixto e Europa, demonstrando assim a existência de outro mundo como centro de um sistema planetário.
Já no início do século XX, o astrónomo americano Edwin Hubble (1889-1953) demonstrou que todas as estrelas visíveis fazem parte de uma única galáxia, a Via Láctea, à qual pertencemos. A chamada nebulosa de Andrómeda observável à vista desarmada, nada tem a ver com as estrelas visíveis, pois trata-se de outra galáxia situada a mais de dois milhões de anos -luz. Como todas as ciências, a Astronomia avançou no século passado com um ritmo alucinante, estendendo os seus horizontes para milhares de milhões de “parsecs”, unidade astronómica equivalente a 3,26 anos-luz. Seguiu-se a descoberta de outros corpos como pulsares, quasares, buracos negros, enquanto a espectroscopia e a radioastronomia abriam mais horizontes até aí inimagináveis.
Chegámos assim à teoria da expansão universal e ao número inconcebível de dez elevado a sessenta! Mas, repito, a mesquinhez do conteúdo dos crânios da maioria dos seres humanos continua a ver apenas a Terra, o Sol, a Lua e pouco mais. É por causa dela e das crendices que os chamados astrólogos, videntes, quiromantes, bruxos e afins vão governando bem a vida constituindo uma seita de vigaristas e charlatães que gera um círculo vicioso o qual, estimulando a crendice, faz com que pululem como bactérias patológicas causadoras do estrangulamento da inteligência. É caso para dizer “Karamba”. (esta é para esse “genial professor” e colegas que nos infestam com a sua propaganda as caixas de correio e “prevêem o futuro”, mas não acertam na lotaria)!
É óbvio que voltar a ensinar essa gente ignorante que infesta o chamado mundo civilizado, mas que completou os estudos liceais, é de fazer perder a paciência a pessoas que, como eu, já nasceu sem ela (é um facto que assumo). Por isso para quê explicar o que é a precessão dos equinócios, que faz com que os falsos signos do Zodíaco recuem na sua posição em cada dois mil anos (entrámos agora na era do Aquário), que as constelações são apenas formas ocasionais na medida em que “desenham” figuras imaginárias sem qualquer relação entre si e nunca mantém o mesmo formato, pela simples razão que todas elas se movem, mas devido à enorme distância a que se encontram, são precisos muitos séculos para se notar as alterações. Este facto pode ser demonstrado em movimento acelerado por qualquer computador, como faz Carl Sagan num dos episódios da sua série “Cosmos”.
Mas para os sapientíssimos astrólogos, tudo está como há quatro mil anos, nem antes nem depois, quando os Assírios e Sumérios estabeleceram as fantasiosas constelações do Zodíaco. Mas esses têm a desculpa da ignorância da sua época. E, por mais incrível que pareça, os nomes atribuídos aos planetas correspondem à sua influência sobre os terrestres quando são aparentemente projectados nas já referidas hipotéticas constelações: Vénus o amor, Marte a guerra, Júpiter qualquer outro disparate e por aí fora! De facto é espantoso como as pessoas embotam as suas inteligências e não fazem o menor esforço para pensar nas incongruências de tudo isto. E como apregoam a torto e a direito que são "Virgens", "Capricórnios", "Carneiros", "Touros", etc., sem ter qualquer noção do que isso significa. Claro que os primeiros são já uma espécie em vias de extinção; mas, quanto aos três últimos, não há motivo de preocupação já que constituem uma grande variedades de seres, tanto bípedes como quadrúpedes. Afinal, tenham a forma que tiverem, todos os cornos são iguais nas suas funções, mesmo nas ornamentais.
Há tempos falava eu com o irmão de um desses senhores, aliás muito conhecido nos meios dessa falsa ciência e, aproveitando a situação, contestei a veracidade da astrologia. Defendeu-se com o argumento de que não tinha conhecimentos científicos para me contradizer, mas que já tinha verificado tantas coincidências que era forçado a acreditar nas previsões do irmão. Pois é, respondi. O problema é que a verdadeira Ciência não se pode basear em coincidências por maiores que sejam. Só a experimentação sistemática e honesta pode levar das hipóteses às teorias e estas, depois de cientificamente comprovadas, conduzem finalmente às Leis ou Princípios. Foi assim que muitos cientistas levaram avante grandes descobertas, recusando peremptoriamente o que ensinavam os livros do passado e creditados como infalíveis.
Não há, contudo, que negar o inestimável contributo que a Astrologia deu para a verdadeira ciência da astronomia. Aconteceu com outras disciplinas, como é normal em tudo que evolui. Citemos a título de exemplo Tycho Brahe, astrólogo dinamarquês (1546-1601) que fez um notável trabalho sobre as posições das estrelas, cometas e, principalmente, dos planetas. Para isso construiu vários aparelhos para as suas observações, anteriores à invenção do telescópio. No final da sua vida teve como aluno, embora durante pouco tempo, aquele que pode ser considerado o primeiro a dar a machadada que separou o mito da razão na ciência dos corpos celestes: o alemão Johannes Kepler (1571-1630), o descobridor das três leis que regulam os movimentos dos planetas. Hoje ainda há quem não lhe perdoe o facto de ter usado a astrologia como ganha-pão para si e para a família, mas são suas estas palavras: “a astrologia não passa de uma filha louca; mas, grande Deus! Onde estaria a astronomia, tão sábia, sem essa filha demente”?
Portanto não podemos negar, como atrás disse, o papel da astrologia, no desenvolvimento da astronomia, tal como a alquimia o foi para a química. Mas o que é lamentável ou, conforme a maneira de ver, pura e simplesmente cómico, é verificar como esses “profissionais do futuro” estão parados no tempo! Afinal não é só a estupidez humana que é maior que o Universo. Também a crendice e a superstição competem com ela. Para quê mais comentários? No fim de contas ainda hoje há muito boa gente que não acredita que o homem chegou à Lua. E por seis vezes. Foram as naves Apolo 11, 12, 14, 15, 16 e 17, a primeira em 1969 e a última em 1973. Falhou a número 13, é verdade, o que constituiu uma "confirmação" para os supersticiosos que sofrem de triscaidecafobia, ou seja medo do número 13. Esta palavra, hoje em desuso, tem a sua lógica, uma vez que deriva do grego trsiskaideka (treze) mais fobos (medo).
E para terminar este artigo vou referir-me ao caos da legendagem. Com efeito, depois de ter visto a série “Cosmos”, termo também derivado do grego kósmos e que significa “ordem”, não posso deixar de pensar no “Caos”, palavra igualmente derivada do grego khaos e usada pelo poeta helénico Hesíodo (séc.VIII a.C.), significando o vazio primordial. Por extensão, na tradição platónica, deu o estado geral e desordenado dos elementos, por oposição ao Cosmos.
Ora enquanto assistimos às explicações da “ordem” do Cosmos, somos obrigados a seguir a legendagem da “desordem” do Caos. Quem terá sido o sapiente tradutor? Tecnicamente, até não se encontram muitos disparates; mas, que português será aquele?
O seu autor será brasileiro, espanhol ou “chinamarquês? Na caixa que contém os discos não há qualquer referência, pelo que sinto-me muito contrafeito por não lhe poder enviar os meus “parabéns”, quanto mais não fosse pelo método de “propulsão a jorro” com ele escreveu?!
Porque ser tradutor é muito complicado. É preciso dominar tanto a língua que é traduzida como aquela para a qual se traduz. Claro que para as traduções do dia a dia, o referido domínio deve centrar-se na correcção e fluência das duas línguas, de modo a que se perceba a ideia original e não se cometam erros grosseiros de gramática como, infelizmente, se vê e ouve nos diferentes canais televisivos. Mas isso constituiu o primeiro texto deste blogue intitulado “Tradutores Incompetentes e Locutores-Papagaios”.
- E já agora aproveito para dizer que tenho uma grande amiga que é tradutora e a quem por vezes pedem que corrija algumas traduções feitas por outros. Já chegou a recusar esse trabalho porque a tradução era tão má que seria preferível fazer tudo de novo! E tem toda a razão. Se todos fossem profissionais como ela, não teríamos de decifrar (nalguns casos é mesmo impossível) certas “instruções” que acompanham alguns produtos contrariando o que a Lei determina, mas a que nenhum Governo dá importância. Aqui vai um exemplo de uma "tradução" que acompanha o que vulgarmente se chama um telefone para chuveiro: "1- Coloque o vedante de borracha no final de cônicas comandante bric flexografia e rosquelo para cucha. 2-colocou outra placa de borracha no outro extremo da flexografia comandante e rosquelo na torneira". Espantoso, não é? Estas notas "explicativas" acompanham o referido produto importado da China por "Antemax Comércio Internacional Unipessoal, Lda". Os meus mais sinceros parabéns.
E a terminar, e porque julgo ser interessante para quem me lê, informo que possuo um exemplar de "Os Lusíadas” traduzidos para francês em rima (!) por um senhor chamado Hyacinthe Garin, e editado em Lisboa pela “Typographia da Companhia Nacional Editora” em 1889. É claro que ao dar este exemplo não pretendo de modo algum que os tradutores sejam tão eruditos. Mas há limites para a ignorância, principalmente quando metemos ombros a uma tarefa.

E até à próxima.

P.S.
Aviso aos terráqueos ignorantes e, em particular a uma certa aldeia gaulesa: a actual conjunção Júpiter-Úrano na constelação do Carneiro, pode fazer com que este dê uma marrada no céu e o faça cair sobre as suas cabeças!!! Que Deus ou Toutatis nos livrem!


26/06/2010

“PRÓS E CONTRAS” COM PAPAS NA LÍNGUA (2ª parte)

“PRÓS E CONTRAS” COM PAPAS NA LÍNGUA

MAS O QUE VIMOS E OUVIMOS FOI APENAS… “PRÓS”!

(2ª PARTE)

E depois da malfadada publicidade, lá veio a 2ª parte do programa “Pró-Papa”.
Falou a abrir Pedro Castro, o líder da empresa encarregada da construção dos altares em Lisboa e Porto e de toda a logística para receber o Papa. Ficámos a saber que, como a Igreja não tem dinheiro, foram contactados vários empresários para financiar os custos. Este facto fez-me vir à memória a frase do cardeal Cerejeira quando foi demitido pelo Papa Paulo VI em 1971: “saio tão pobre como entrei, e vou viver das esmolas dos paroquianos”. Na altura fiquei muito preocupado com tanta penúria e, se fosse rico, ter-lhe-ia comprado o “Bentley” que possuía. Mas adiante.
Marcelo Rebelo de Sousa, continuando a papaguear as verdades dele e dominando aquele pseudodebate, referiu a posição de Lisboa no mundo, a evangelização feita pelos Portugueses com uma mensagem que inspirou um dos lances mais felizes da Europa, como seja a propagação da igualdade, da universalidade, da humanidade, do respeito da pessoa, embora muitas vezes com erros e opressões, concluindo que foi Portugal que iniciou a globalização. Deu também a entender que Portugal fez isso sem interesse. (Deve ter sido único na História). Fátima Campos Ferreira ainda contrapôs, que a Igreja nem sempre conseguiu levar a bom termo essa mensagem, mas Marcelo, mais uma vez disse que esta é feita por homens. Com tanta insistência neste tema acabei por ficar sem saber se a dita instituição é de Deus, do Diabo, dos Homens, ou de um desconhecido qualquer!
Por sua vez a irmã Fátima Guimarães disse que sempre conseguiu arranjar dinheiro de anónimos porque há muita gente boa neste país. Disse também que não tem medo de entrar em certos locais porque o Papa disse que no fundo toda a gente, mesmo fazendo asneiras, tem sede de Deus. E continuou dizendo que até já se sentou ao lado de um rapaz às duas da manhã para lhe dizer que Deus o ama e que não tem medo nenhum, até porque tem a Polícia por detrás dela e que a ajuda em caso de necessidade. Este caso provocou o riso na bem-aventurada assistência, extensivos ao comandante da Polícia presente. Ficámos assim a saber, e as palavras são dela, que Deus ama os criminosos, portanto não há que ter receio. Pela minha parte julgo que isto só passou a acontecer quando o Papa anterior encerrou o Inferno e aquela coisa disparatada que era o Limbo, e para o qual iam as indefesas criancinhas não baptizadas. Isto faz nascer a esperança de que um dia o Purgatório seja também banido de tão sábia religião. E a propósito de purgas, lembrei-me que Molière dizia que os médicos só serviam para três coisas: fazer sangrias, dar purgantes e mandar a conta. Felizmente que hoje fazem muito mais do que isso pois os tempos mudam, e pode ser que um dia surja um Papa que determine a existência de um Céu para todos, bons e maus, unidos na infinita misericórdia do Deus da Bíblia que ainda não se lembrou de proibir que nasçam crianças defeituosas.
E a propósito, permitam-me uma anedota: um garoto que nasceu com vários defeitos físicos e psíquicos começou a dizer palavrões a torto e a direito. A mãe, já de si preocupada com o estado do filho, ficou horrorizada ao ouvir o escatológico palavreado que, por entre vários esgares, saia da boca da criança. Por isso resolveu repreendê-lo com o clássico “se continuas a dizer asneiras, Deus Nosso Senhor castiga-te”. O garoto, que apesar dos seus defeitos não era totalmente parvo, perguntou: e o que é que ele me faz? Despenteia-me?
Mas continuando.
Falou depois o comissário Pedro Flor da PSP, encarregado da gigantesca operação desencadeada para proteger o Papa, não fosse Deus estar distraído com assuntos inerentes a outros mundos, e deixar o Diabo cometer um atentado contra o seu representante no planeta Terra. Conclui-se assim que nem Deus nem o ridículo “papamóvel” são já suficientes para proteger Sua Santidade nos alegados tempos perturbados em que vivemos. Afinal, quem tem cu também tem medo!
E poderia continuar com uma análise mais aprofundada do que se disse naquele dogmático programa, mas menciono apenas o facto de Fátima Campos Ferreira ter perguntado a Marcelo Rebelo de Sousa qual era o espaço dos ateus e agnósticos que, nas suas casas, assistiam ao programa. É estranho, ou melhor, sintomático, que só no final do programa se tenha lembrado deles. Por isso pergunto? Porque não convidou alguns, fazendo assim jus ao título do programa que sempre tem respeitado?
Entusiasmado, como sempre, o professor "explicou" que todos têm o seu espaço e deu, como exemplo o Papa, um homem da razão, que chega à fé através dela. Que fácil é, para aqueles que crêem, inverter a realidade das coisas , esquecer, consciente ou inconscientemente, todos os males e catástrofes horrendas que a sua religião provocou, para além de alimentarem-se de deuses, estátuas e coisas afins sem ter a mínima base ou prova científica. No fim de contas, até está certo. A Idade da Razão principiou apenas há três séculos, o que, no contexto histórico, representa apenas uma ínfima fracção de segundo.

Mais uma vez alonguei-me demasiadamente nesta luta inglória contra a ignorância e a crendice, razão de ser deste blogue. Assim vou terminar esta 2ª parte do texto dedicado ao programa “Prós e Contras” do passado dia 10 de Maio do Ano da Graça de 2010, apresentando a minha conclusão: de facto foi um programa especial, como disse Fátima Campos Ferreira no início da transmissão. Assim oro, embora não saiba a quem deva fazê-lo, com esta litania: Abençoada sejas tu RTP que aplicando honestamente o dinheiro oriundo das taxas e da publicidade que te sustenta, nos proporcionaste quase duas horas de falso debate, concordância de ideias, amor entre os homens (e em Cristo, não esqueçamos), e mesmo com bacalhau e mariscada à mistura, todos os intervenientes, bafejados pela mensagem emanada das Sagradas Escrituras e envolvidos na brumosa aura da sua religião, a única verdadeira, e na qual só alguns estúpidos como eu não acreditam, disseram:

SUPERCALISFRAGILISTICEXPIALIDOCIOUS!
E eu acrescento: AMEN!!!

Mas, é claro! O burro sou eu! Mas onde é que já ouvi isto?

COMENTÁRIO FINAL:
Desde que nasci, em 1942, “conheci” seis Papas: Pio XII, João XXIII, Paulo VI, João Paulo I, João Paulo II e, agora, Bento XVI.
Quando o primeiro morreu, ou antes, foi ter com Deus em 1958, chamaram-lhe “O Papa da Paz”, embora não tenha ganho o respectivo Prémio Nobel. Mas durante o seu pontificado eclodiu a 2ª Guerra Mundial, para só falar desta.
João XXIII tentou aliviar a corrente da âncora que prende a Igreja Católica ao mais abjecto conservadorismo e, decerto modo, conseguiu. Pelo menos começou a viajar para tentar compreender o mundo e as suas mudanças.
Paulo VI fez marcha-atrás, e até veio a Fátima adorar e louvar a estátua da chamada Virgem Maria.
E João Paulo I, o"Papa Sorriso"? Quem é que se lembra dele? Estranhas coincidências rodearam o seu pontificado de trinta e dois dias. Lembro-me muito bem da sua figura que nada tinha de falsa beatificação, dos seus pequenos óculos que não conseguiam esconder a claridade sorridente dos seus olhos, e de ouvi-lo declarar com um verdadeiro ar de humana admiração nunca ter pensado que lhe iria acontecer semelhante coisa: ser eleito Papa. Recusou a coroação formal, ser transportado em liteira e pretendeu acabar com o bolorento conservadorismo que infesta a Igreja Católica.
Também me recordo que a imprensa da época (que agora se chama “os media”) ter mencionado que ele pretendia investigar as finanças do Vaticano, das quais era ministro um bispo do qual não me lembro do nome. Pouco tempo depois apareceu morto na cama, lendo “A Imitação de Cristo”. Coincidências ou acção da Mafia que governa o Vaticano?
Mas isto é uma mera suposição. Àquelas coincidências, seguiram-se outras que parece terem caído no esquecimento. Senão, vejamos:
1º- A Igreja Católica e o comunismo sempre foram antagónicos, e para lá da “cortina de ferro”, ensinava-se e impunha-se o ateísmo, mesmo considerando que Jesus Cristo tenha revelado algumas teses que hoje seriam designadas como marxistas.
2º- Quando foi eleito João Paulo I, na Polónia, país de grandes tradições católicas, o sindicalista Lech Wallesa começava a contestar o “democrático” partido comunista que governava o país, acabando por fundar dois anos depois o sindicato "Solidariedade", que seria o princípio do fim do regime.
3º- A esmagadora maioria dos Papas foi italiana. (lembro o português João XXI, também conhecido por Pedro Hispano, que reinou apenas oito meses no século XIII). Curiosamente, logo após o estranho desaparecimento de João Paulo I, é eleito um Papa…polaco!
4º- Poucos anos depois, em 1985, Mikhail Gorbatchev foi eleito secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética. Daí em diante o mundo ocidental foi confrontado com duas palavras que acabaram por se tornar proféticas: “perestroika” e “glamost”. A primeira referia-se às necessárias e urgentes reformas para restaurar a economia russa, destruída por décadas de colectivização forçada. A segunda referia-se à abertura da vida cultural e aos planos para limitar a censura e encorajar livres debates políticos.
5º- A Igreja Católica aproveitou-se logo da situação, como fizera em 1917 com as chamadas aparições, e quis adaptar um dos especulativos ”segredos” de Fátima à conversão da Rússia. Acrescente-se que a Rússia nunca se desconverteu. O regime, como foi dito, é que reprimia toda e qualquer religião.
6º- João Paulo II “foi o Papa que mudou o mundo”. Mas foi ele, Lech Wallesa, Gorbatchev ou Boris Ieltsine? E será que a mudança foi assim tão grande? Nunca houve outras mudanças até maiores em toda a História?

E termino, finalmente, pedindo desculpa por neste epílogo ter feito suposições capazes de fazer sorrir Sherlock Holmes. "Elementar, meu caro Watson". Ou talvez não!


08/06/2010

"PRÓS E CONTRAS" COM PAPAS NA LÍNGUA (1ª parte)

"PRÓS E CONTRAS" COM PAPAS NA LÍNGUA

MAS O QUE VIMOS E OUVIMOS FOI APENAS... "PRÓS"!


(1ª PARTE)


No programa de Fátima Campos Ferreira “Prós e Contras” do passado dia 10 de Maio, foi abordada a visita de Bento XVI a Portugal. Que me recorde, e referindo-me apenas aos programas que vi, este foi apenas “prós” já que, e como é costume na RTP, quando se fala da Religião Católica, há sempre um estranho esquecimento no que respeita a ateus e agnósticos, para não falar de outras religiões com menor implantação mundial, mesmo que sejam cristãs.
Daqui podemos concluir que a RTP é mais papista que o Papa, considerando que os Portugueses elegeram Jorge Sampaio Presidente da República por duas vezes (e possivelmente mais se a Constituição permitisse) apesar de ter declarado antes de ser eleito, e perante as câmaras da Televisão Pública, que era ateu. Para um país com tantas tradições católicas, o que é inegável, é caso para começar a meditar sobre o que está a acontecer na mente do povo português. Será que começa a abrir os olhos?
Mas voltemos ao programa que deveria ter sido intitulado “Pró-Papa”.
Como nota introdutória Fátima Campos Ferreira falou dos que têm outra religião e dos ateus (esqueceu-se dos agnósticos) e apresentou os convidados entre os quais se destacaram Carlos Azevedo, bispo auxiliar de Lisboa e coordenador geral da visita papal, o professor Marcelo Rebelo de Sousa, o presidente da "Caritas" Eugénio da Fonseca e a psiquiatra Margarida Neto. Na plateia destacou a figura da actriz Glória de Matos, o representante da Direcção Nacional da PSP, comissário Pedro Flor, o porta-voz da Conferência Episcopal Portuguesa, padre Manuel Morujão, o padre Tolentino Mendonça, os responsáveis pela construção do altar de Lisboa, Pedro Castro e Marta Roquete, as deputadas Teresa Damásio e Isabel Galriça Neto e, pela Comunidade Islâmica de Lisboa, um senhor cujo nome não consegui perceber para além de Mohamet, e que acabou por não aparecer.
O bispo auxiliar foi o primeiro a ser interrogado sobre o significado de tão transcendental visita mas, como era de esperar, repetiu o mesmo discurso que todos fazem nestas ocasiões, seja qual for o tipo de visitante. Como é óbvio, e como se tratava do patrão, lá veio a inevitável alusão a Fátima e ao Deus em que crê. Mas, e o comentário é meu, delega nas suas criaturas as soluções para todas as crises, por mais que as suas ovelhas orem a pedir o seu auxílio, mostrando que, na realidade, não passa de um mau pastor. Ao menos o cão, também criatura de Deus, mostra-se muito mais zeloso, dedicado e protector.
Por sua vez, Marcelo Rebelo de Sousa, como sempre defendendo a sua dama, ainda aludiu à Inquisição, criticando o facto de se matar pela fé. Esqueceu-se, porém, que a morte infligida aos desgraçados que caím nas garras dessa instituição, não era rápida, o que até seria uma bênção. Para além dos terríveis meios utilizados para chegar a ela, as torturas incapacitaram fisicamente ou levaram à loucura famílias inteiras num total de muitos milhares de pessoas.
Quanto à visita de Bento XVI referiu a alegria que todos os católicos iriam sentir ao receber o seu líder espiritual, e afirmou com a sua característica entoação que não admite dúvidas, não haver provas sobre o encobrimento dos casos de pedofilia na Igreja Católica. Antes pelo contrário. Ó senhor professor: não lhe chega o documentário da BBC, exibido pela SIC, com tantas testemunhas e relatos de membros da própria Igreja Católica sobre o encobrimento do documento Crimen Sollicitationes, datado de 1962, e de que foi vigilante durante vinte anos o cardeal Ratzinger, depois promovido a Papa pela “inspiração”divina que bafejou os seus colegas eleitores, e que se manifestou por uma pequena fumaça branca saída de uma chaminé? E que este documento impõe silêncio aos clérigos, às vítimas e às testemunhas sob pena de excomunhão? Bem sei que o senhor é doutorado em Direito, pelo que não quero de modo algum meter-me em disciplinas que desconheço. Mas, não será que a sua fé lhe faz ofuscar a razão, como aconteceu, por exemplo, com um Leibniz ou um Einstein, como já referi num texto deste blogue? Aconteceu a muitos grandes génios em todos os tempos e há que respeitá-los tanto pelas suas obras como pelas suas crenças, desde que estas últimas não prejudiquem as primeiras. Porque, no fim de contas, religião e ciência, em virtude do dogmatismo da primeira, nunca se deram bem. Como disse Carl Sagan , "a supressão de ideias desconfortáveis pode ser comum na religião e na política, mas não é o caminho para o conhecimento". Pela minha parte, acrescento: na ciência, muitas delas tornaram-se leis ou princípios. Na fé, não passam de hipóteses sem fundamento.
Quanto à crise sem paralelo que a Europa atravessa, permito-me perguntar ao professor se a História do Velho Continente (e de todo o planeta) não é toda feita de crises, sejam elas maiores ou menores, e relativas à época e ao local onde se desenrolam. Antes de embarcar nas suas entusiásticas retóricas, lembre-se da História Universal que estudou no liceu e que, na sua esmagadora maioria, é constituída por guerras, crimes, pestes, e catástrofes de toda espécie. A maior parte delas foi originada pelas estúpidas sucessões dinásticas das monarquias e, no caso da Europa, pelas várias cisões dentro do próprio cristianismo. O mundo só mudou científica e tecnologicamente. Em tudo o resto está absolutamente na mesma, por mais Moisés, Budas, Cristos e Maomés que apareçam a apregoar a liberdade e justiça em nome de todos os Deuses que quiserem. Seria fácil confirmá-lo se houvesse imagens gravadas do passado. Talvez muita gente passasse a dizer “como o mundo é” e não apenas “como o mundo está”. E é disso e do progresso científico, que a religião católica tem e sempre teve medo. "Bem-aventurados os pobres de espírito porque deles é o Reino dos Céus.". Consta que Jesus Cristo disse isto mas, francamente, não vi o filme «Jesus de Nazaré» de Zefirelli. (Perdoem-me a ironia) Ou ainda: "não lhes abras os olhos patrão; o que é que vão ver? A sua miséria? Eles passam fome, fazem filhos e dizem: Deus seja louvado" (in «Alexis Zorba» de Nikos Kazantzaki).
Eugénio da Fonseca, presidente da “Caritas”, uma organização a todos os títulos louvável mas que seria desnecessária se “tudo corresse pelo melhor no melhor dos mundos possíveis”, como afirmava Leibniz, teve de responder a uma daquelas perguntas inúteis e disparatadas que os jornalistas costumam fazer. Ao ser interrogado se a visita do Papa era importante, uma vez que ia ter um encontro com as várias redes sociais portuguesas, respondeu que…era importante, já que o Papa, na sua primeira Encíclica, mostrara interesse pela obra caritativa da Igreja e que, por isso, tinha ficado surpreendido! Depois acrescentou que todos os Pontífices tinham feito o mesmo!?
Mais clara foi a psiquiatra Margarida Neto, quando afirmou que, e passo a citar, que "a Igreja preenche as mulheres e os homens do nosso tempo como preencheu ao longo da História, e perdura o grande milagre que é uma instituição com certeza ter sido ferida em muitas falhas, que são de natureza humana; os casos de que aconteceram, que acontecem, são porque padres, os religiosos e as religiosas são homens e mulheres e, portanto, com fragilidades como todos temos, mas preenche porque, e voltando à mensagem principal do Papa, que era aquela que eu mais tenho expectativa de ouvir, e tenho a certeza que vou ouvir, é este grande chapéu que começa na primeira encíclica de que o professor Eugénio estava a falar, que Deus é amor, e é isso que me parece que é o centro da fé". Referiu-se também à solidão e às mulheres, realçando que sendo Deus amor, significa tudo para uma mulher, e que a presença desta começa com Maria.


Depois de ter ouvido e tentar compreender tanta erudição, e enlevado pelo extraordinário misticismo por ela revelado, comecei seriamente a pensar em consultar uma (ou um) psiquiatra. Mas, uma vez acalmados os meus hipocondríacos receios, considerei que talvez este acto de possível terapêutica ficasse melhor à referida doutora, ou consultando uma colega de ofício, ou fazendo uma auto-consulta.


Mas foi a deputada do CDS ,Teresa Damásio, que fazendo eco da confusa verborreia da senhora licenciada em psiquiatria, e fazendo jus ao elevado cargo que ocupa na sociedade portuguesa, velando, qual sentinela firme e erecta, pela religião tradicional dos cidadãos, confirmou de maneira incontestável, os sagrados caminhos da doutrina cristã. Para isso utilizou uma retórica capaz de fazer inveja aos mais eruditos. Insistiu que a Igreja actual tem sabido acompanhar a evolução dos tempos, até porque foram mulheres que acompanharam Cristo na Galileia quando foi crucificado, e ainda que foram elas que foram ao Santo Sepulcro verificar que tinha ressuscitado. (Mas, segundo a Bíblia, só apareceu em carne e osso aos seus discípulos, verificação muito materialista confirmada por S. Tomé. Depois armou-se em astronauta e subiu aos céus, não fosse o seu povo entregá-lo de novo á populaça por quem lutou). E continuou dizendo que as mulheres estão presentes na Bíblia e na Igreja, e espera que um dia sejam ordenadas padres. Por isso não se sente discriminada. Disse, ainda, que a vinda do Papa nesta altura de crise, é muito importante para Portugal, tanto para os crentes como para os não crentes, e que o Espírito Santo vai iluminar todos. Fátima Campos Ferreira acabou por interromper tanta eloquência, o que não foi má ideia visto que a doutora Margarida tinha dito mais ou menos o mesmo.
Nesta parte do "imparcial" programa televisivo, lembrei-me da Mary Poppins e de Julie Andrews a cantar supercalisfragilisticexpialidocious, ou seja “uma coisa que se diz quando não temos nada para dizer”. A propósito: Quem não se recorda deste delicioso filme da Disney?
Continuando o interessante espectáculo que a Televisão Pública proporcionou, entrou em cena o padre Manuel Morujão, falando com aquele sibilar característico de quase todos que andaram no Seminário. Porque o fazem, nunca cheguei a perceber. Nem o doutor Salazar escapou a essa espécie de contágio. Enlevado por um ar de beatificação e de felicidade, parecendo rodeado por uma aura só comparável à da Sra. Dª. Aura Miguel, conceituada jornalista da Rádio Renascença que teve a honra sublime de ter falado com João Paulo II, parecia ser o possesso da verdade. Cheguei a recear que começasse a levitar, quanto mais não fosse para provar que o Deus da Bíblia pode anular a Lei de Newton. Explicou, assim, que não podíamos ver os papas como um Wojtyla ou um Ratzinger, já que todos eram Pedro. (que confusa hereditariedade!)
E prosseguindo com aquele ar de quem anda numa nuvem rodeado de anjinhos e de virgens, (até porque as outras mulheres são pecadoras), também se esqueceu que o papado é feito por homens com todas as suas qualidades e defeitos, tal como os Deuses das religiões que, na minha opinião, foram criados pelo ser humano à sua imagem e semelhança, e não o contrário como tentaram impingir-me em criança. Por isso omitiu (ou fingiu não saber) que no Vaticano, como em qualquer sociedade humana, facto aliás mencionado pela Drª Margarida Neto, existem qualidades e defeitos susceptíveis de serem apoiadas ou condenadas conforme o modo como são apresentadas, ou a maneira de ser de quem as vê ou quer ver.
Por isso não falou dos filhos dos Papas, das suas taras sexuais, do Grande Cisma do Ocidente em que pontificaram simultaneamente dois Papas, um em Roma e outro em Avinhão (França), nem da Papisa Joana que reinou dois anos no Século IX, e que deu origem à célebre frase “Habemos Papa”. Acreditem ou não, depois daquela bronca, os novos Pontífices tinham que se sentar numa cadeira com um buraco, pelo qual um inspector, verificando se tinha testículos, confirmava com aquelas palavras que se tratava de um homem, não fosse o Diabo tecê-las e colocar no lugar de Pedro esse ser desprezível, estúpido e ignorante chamado mulher. Viva o machismo. E, já agora, pergunto se não será por isso que a RTP tem grande afinidade com a Igreja Católica e os seus chefes. É tudo uma questão de ter “tomates”, como o seu funcionário José Rodrigues dos Santos, que se julga muito engraçado, afirmou ao terminar um telejornal dizendo que era um final com os ditos penduricalhos. Sobre esta e outras gracinhas desse senhor, que pode ter jeito para muita coisa menos para apresentar o telejornal, já escrevi um pequeno artigo neste blogue.
Numa outra intervenção, o senhor bispo auxiliar esclareceu que a alegria cristã nunca ofende a tristeza dos outros, e que os critérios dos mercados vão contra a verdade dos factos. Mais uma vez a falta de memória ,ou o ópio da fé, fez que não dissesse que o Vaticano está a abarrotar de riquezas, a maioria roubadas, o que contraria a chamada “missão caritativa da Igreja”.
Marcelo Rebelo de Sousa tudo ia ouvindo com um ar de bem-aventurança, intervindo aqui e acolá, impregnado como estava pelo seu dogmatismo. Aliás foi o convidado que falou durante mais tempo. Se estivesse sozinho teria, certamente, eclipsado Fidel Castro. Este defendendo as "virtudes" do comunismo, aquele as "verdades" do catolicismo. Ossos do ofício.
Noutro momento do programa, Fátima Campos Ferreira pediu ao senhor bispo auxiliar que explicasse como foi possível o Papa, como coordenador da verdade, ter escondido o documento Crimen Sollitationes. O bispo auxiliar meteu os pés pelas mãos e tentou atirar a explicação para o passado, dando a entender que o Papa, na sua nova condição, já não era a mesma pessoa. Por isso agora já assumia o problema da pedofilia na Igreja Católica mas, que de qualquer modo, tudo não passava de uma campanha para o denegrir.
Depois Glória de Matos falou sobre as diferenças entre os dois últimos Papas. Como é óbvio todos somos diferentes (mas afinal não são todos Pedro?) e foi eleito numa altura em que se contestam todas as lideranças e valores. Mas, tal como ao nosso pai, temos que obedecer ao Papa mesmo que não concordemos. Até porque "as pessoas estão secas e andam umas contra as outras".
Mais uma vez a amnésia, essa estranha doença que a algumas pessoas faz esquecer o que não lhes interessa, entrou em cena. Assim não falou dos conflitos que desde sempre animaram a história da humanidade, como por exemplo as Cruzadas, a chacina dos Judeus em Lisboa no reinado de D. Manuel I, o chamado "Venturoso", na matança da noite de S. Bartolomeu ocorrida em França em 1572, em que os católicos se deleitaram a massacrar dezenas de milhar de protestantes, etc. etc. Tudo isto foi olvidado pelos convidados e pela apresentadora, facto que se estendeu à assistência que, aliás, não se mostrou nada avarenta nas suas entusiásticas ovações. No fim de contas tratava-se de aplaudir mais um "santo padre"!
Rita Neto, tentando mudar de assunto sem dizer nada, falou da Ressurreição, e disse que esta é alegria e que os católicos vivem num mar de alegria. Mas não disse que também os católicos têm medo da morte, e quando o Papa está para morrer fazem uma choradeira tremenda e rezam para que isso não aconteça. Até porque quando uma pessoa se salva “graças a Deus”, ninguém diz que Deus não a salvou, mas que apenas adiou a morte. Não será óbvio?
O padre Tolentino Mendonça, à pergunta se Bento XVI sente a necessidade de uma nova evangelização da Europa, começou por criticar o intelectualismo e afirmar que o Papa é um homem com ideias claras. (Deve conhecê-lo há muito tempo) . Depois veio com a velha história dos Evangelhos e dos grandes valores europeus, do modo como o Cristianismo faz parte da cultura da Europa e de Paulo de Tarso, que veio dizer que nas cidades gregas e em Roma já não havia cidadão nem bárbaro, nem escravo nem homem livre, nem distinção entre homem e mulher, donde se conclui que o Cristianismo lançou um novo ideário civilizacional. Sem dúvida que o encontro da Europa com o melhor de si própria está no coração de Bento XVI, e até há quem diga que este Papa é o último iluminado da Europa! Possivelmente, digo eu, quando morrer transmitirá o cognome por herança. De facto não há nada como louvar o patrão actual. Mas a sua amnésia apenas lhe permitiu falar de Paulo de Tarso, esquecendo-se de grandes pensadores cristãos tais como Abelardo, Erasmo, ou Lutero que criticaram ou revoltaram-se contra a Igreja de Roma devido aos seus crimes e contradições.
A irmã Fátima Guimarães, da “Pastoral Social”, ao ser instada sobre como se espalha o amor (lá veio o inevitável “no terreno” repetido três vezes no espaço de apenas vinte e dois segundos) explicou, com latim pelo meio, que visita reclusos com outros elementos da organização a que pertence para lhes comunicar que Deus os ama mesmo na condição em que se encontram, que podem recomeçar do zero, anuncia-lhes Jesus com alegria, e faz uma saudação da palavra. Depois “vamos para o sítio onde eles estão, vamos com a deles, entramos com a deles e saímos com a nossa” (sic).
A empresa portuguesa “Gelpeixe” veio mostrar a prenda que ia oferecer ao Papa: uma caixa com a assinatura de todos os funcionários contendo peixe congelado, já que o desenho de um peixe era a senha secreta usada pelos Cristãos para se identificarem em Roma durante as perseguições, e é também um símbolo de Portugal, tanto como descobridor de novos mundos como pescador. Bacalhau, polvo, sardinha e mariscada, já que o Papa é um grande apreciador de bacalhau. Marcelo Rebelo de Sousa interveio, mais uma vez, para dizer que aquela oferta era uma mostra da alegria que católicos e não católicos sentem por receber o Papa. Sempre a eterna mania que muita gente tem de falar em nome de todos. Aconteceu na nossa História recente com as chefias militares hoje conhecidas como “A Brigada do Reumático” que, com excepção dos generais Spínola e Costa Gomes, foram prestar juramento de fidelidade a Marcelo Caetano em nome de todas as Forças Armadas. Cerca de um mês depois deu-se o 25 de Abril!
E agora vou fazer um intervalo, tal como no programa “Pró-Papa". Assim, peço desculpa (o que a RTP há muito já não faz) por esta interrupção; o programa segue dentro de momentos!

05/05/2010

CUIDADO COM A LÍNGUA?

CUIDADO COM A LÍNGUA?

BEM PREGA MARIA FLOR...!



Como escrevi no artigo anterior, a maior vergonha é insistir no disparate. É o que se passa nos órgãos de Comunicação Social que parecem ficar indiferentes ou, o que é pior, a gozar com os ensinamentos e chamadas de atenção constantes no programa “Cuidado com a Língua”, finalmente regressado à RTP, da autoria do Professor José Mário Costa e com locução da minha ex-colega da RDP Maria Flor Pedroso. De facto é triste ouvir dizer nesse programa que low-cost, por exemplo, pode e deve ser substituído por “baixo custo” e, pouco depois, ouvir um jornalista ou um apresentador repetir o mesmo anglicismo. Ou então frases do género "fulano reuniu com...em vez de reuniu-se", como se o verbo reuinir não fosse transitivo directo, ou ainda "as crianças saíram a correrem", usando erradamente dois verbos no plural na mesma frase. E isto também acontece por vezes na chamada Televisão Pública, o que prova que há lá dentro quem não se importe em insistir nos disparates, revelando uma total falta de respeito pela Língua Portuguesa e pelos ensinamentos lidos por uma colega, apoiada por uma competentíssima equipa de colaboradores. Se não têm tempo para ver o programa "Cuidado com a Língua", façam como eu: gravem-no para ver depois e guardar como elemento de consulta.
Felizmente já estou voluntariamente reformado da Antena 2 da EN/RDP, hoje fundida com a RTP, e na qual trabalhei trinta e quatro anos. Como tenho um pouco de zaragateiro, quando vejo pisar por ignorância ou propositadamente a nossa Língua, as Artes e as Ciências torno-me chato e, possivelmente, já teria arranjado conflitos com alguns desses novos colegas importados da Televisão para a Rádio. Vejamos agora alguns exemplos para além dos famigerados anglicismos:
Aquando da tempestade que atingiu a ilha da Madeira, um jornalista da SIC ao entrevistar o Professor Anthymio de Azevedo, a dada altura veio com o clássico galicismo “climatérico”, tendo o entrevistado respondido que essa palavra não existe em climatologia. Só não acrescentou, talvez por respeito ao seu interlocutor, que deve dizer-se climático ou climatológico, como foi explicado por Maria Flor num dos seus programas. Curiosamente, quando a mesma entrevista foi repetida na SIC Notícias, este pormenor foi omitido. Coisas!
E já que estamos a falar de fenómenos meteorológicos, e aproveitando a tromba de água que se formou sobre o Tejo, será que os senhores jornalistas terão aprendido o que é uma tromba de água? É exactamente aquilo que aconteceu: um tornado sobre uma superfície líquida que, ao aspirar a água, assume uma forma de tromba (daí o seu nome), e não uma grande chuvada como costumam dizer. Espero que a tenham visto com os próprios olhos. E escrevo esta típica frase para justificar a promessa que fiz no artigo anterior: falar de pleonasmos.
Derivada do grego pleonasmos, que significa excesso, amplificação, exagerar, etc., a palavra pleonasmo constitui, como facilmente se depreende, a qualidade de suficiência, da inutilidade ou da superfluidade. Assim, o seu uso deve ser apenas utilizado como reforço de uma ideia ou situação, tornando-se inútil e enfadonha quando empregada sem qualquer critério ou, como agora infelizmente é usual, devido ao mau ensino que se pratica e que infesta o chamado português europeu que se lê na internet. (Nem ouso falar no apelidado português do Brasil)!
Mas como toda a medalha tem o seu reverso, e já que falámos (e não “falâmos “ como se diz agora) do Brasil, recordo uma piada do grande humorista brasileiro Juca Chaves quando se refere a um garotinho que, ao ser interrogado sobre o que gostaria de fazer quando fosse grande, respondeu que o seu sonho era ser comentador desportivo, para “dizer coisas inteligentes e sábias na televisão”. (Que a memória de Alves dos Santos e o seu eterno “sempre ele”perdoe a inocente criancinha e esta humorística citação).
Em compensação temos hoje de aturar “avança no terreno, recua no terreno, cai no terreno, rola no terreno, sai do terreno, entra no terreno, cospe no terreno, etc.” (já agora a locução conjuntiva latina et cetera também no terreno), como se o futebol não se desenrolasse no terreno de jogo, e tudo isto apenas para “castigar” um infeliz “esférico” ou “redondinha” sujeito a pontapés e cabeçadas de todos os tipos, incluindo os “de primeira”! Mas, e como é óbvio, estas últimas palavras fazem parte da gíria do futebol, tão respeitáveis como as que existem noutras profissões.
Mas voltemos à sobejamente conhecida frase “ver com os próprios olhos”. Neste caso trata-se da intenção de convencer os auditores, como fez Camões na estância nº XVIII do Canto 5º de “Os Lusíadas” quando utiliza a expressão “vi claramente visto o lume vivo”, referindo-se ao fenómeno que os marinheiros denominaram fogo-de-santelmo.
Como é sabido trata-se de descargas de electricidade estática que, durante uma tempestade, por vezes faíscam nas pontas das mastreações dos navios.
Também é costume dizer-se “vinte e quatro horas por dia” entre outros exemplos rotineiros.
Mas o que não é aceitável são frases como “subi para cima” ou “desci para baixo”, ditos que sempre provocaram o sorriso dos auditores com um mínimo de conhecimentos gramaticais.
Mencionemos agora dois pleonasmos que, embora haja quem os não considere como tal, constituem, no meu modo de ver, autênticos disparates. Trata-se de abalo sísmico e habitat natural.
Quando iniciei a minha carreira profissional na Emissora Nacional em 1968 como assistente de programas musicais, havia normas reguladoras sobre a linguagem a usar aos microfones, normas essas que também eram extensivas a todos os órgãos de comunicação ente os quais, e como é óbvio, estava a jovem RTP, então com apenas onze anos. Uma dessas normas proibia (é o termo) o uso da expressão abalo sísmico porque, na realidade, trata-se de um típico pleonasmo que tem tanto de inútil como de mau gosto. E é fácil perceber porquê. Abalo parece provir do latim advallare, que por sua vez vem de vallis, que significa vale. Assim o verbo significa “lançar-se ao vale” e, por generalização, “deslocar-se ou mover-se”.
Por sua vez sismo vem do grego seismós que tem vários significados como “comoção, abalo, emoção, agitação, tremor de terra”. Assim, abalo sísmico pode “traduzir-se” por “abalo abalado”, que é um verdadeiro exemplo dos mais ridículos e inúteis pleonasmos, embora seja aceite pelo Dicionário Houeiss da Língua Portuguesa, com o apoio da Academia das Ciências de Lisboa. Pela minha parte, porém, e porque sou casmurro, continuarei a dizer sismo, abalo telúrico (do latim tellus que significa terra, globo terrestre), tremor de terra, terramoto ou maremoto, no caso deste último ocorrer no mar. Neste último caso poderá provocar raz de maré, termo empregado, como já mencionei num artigo anterior, em “Lições de Geologia” para o antigo 3º ciclo dos Liceus, de que possuo um exemplar pelo qual estudei. Mas agora temos o termo japonês tsunami, em que “tsu” significa porto, ancoradouro, e “nami” onda, mar. Portanto o significado é “onda no porto” (invadindo o porto), e não onda gigante como já ouvi num telejornal uma professora “ensinar” aos seus alunos. E depois não querem avaliações!
Quanto a habitat natural, na minha modesta opinião, é outro pleonasmo. Senão, vejamos: habitat, palavra latina que, literalmente, significa “ele habita”, refere-se, em ecologia, a um ambiente em que estão reunidas todas as condições naturais nas quais um animal ou um vegetal habitam. Ora, e por exemplo, uma pobre ave presa numa gaiola, ou outro animal em qualquer tipo de jaula, por mais “dourada” que esta possa ser, peca sempre, pelo menos, pela falta de espaço. Um golfinho dentro de uma piscina, por maior que esta seja, será sempre para ele uma simples banheira comparada com a imensidade do oceano. E mais ainda quando é obrigado a fazer palhaçadas, para as quais não nasceu. Portanto, um habitat artificial, no meu entender, não existe, embora haja quem defenda essa ideia, talvez porque nunca esteve preso. Estou certo ou estou errado?
E por hoje fico por aqui, cumprindo assim a promessa que fiz no texto anterior, de ser mais breve. Já aliviei mais um pouco a “carga hepática”, conforme revelam as últimas análises que fiz.
Até à próxima.





20/04/2010

NÃO É VERGONHA SER IGNORANTE

NÃO É VERGONHA SER IGNORANTE.
VERGONHA É NÃO QUERER APRENDER OU, PIOR AINDA, INSISTIR NOS DISPARATES.



Mais um título para este blogue que pouca gente vai ler. Para quê, então, escrevê-lo? Simplesmente porque me dá prazer e, fazendo jus ao cabeçalho, trata-se de mais uma tentativa utópica de corrigir os disparates que todos os dias suportamos nos canais televisivos e que titulei de tradutores ignorantes e locutores papagaios num dos primeiros artigos deste blogue.
Mas, e sem falsa modéstia, quem sou eu para julgar a sapiência ou ignorância dos outros? Sem querer entrar em exageros vou citar a célebre frase de Sócrates (o grego!): “Sei apenas uma coisa: é que nada sei”. É óbvio que este dito pretende apenas fazer com que entendamos a pequenez, e a dificuldade (ou impossibilidade) de alcançarmos aquilo a que, vulgarmente, chamamos verdade. Santo Agostinho disse que “se é verdade que a verdade não existe, logo a verdade existe”. Mas isto sugere-me apenas um jogo de palavras em que o pensamento lógico, criado “oficialmente” por Aristóteles, é fértil e até fecundo, mas que também levou a conclusões absurdas, como o facto das entidades eclesiásticas da Idade Média, impingirem à populaça ignorante a ideia que aquele filósofo tinha resolvido todos os problemas científicos. Logo, quem tentasse investigar ou fazer experiências era classificado de herege, tornando-se assim candidato a churrasco humano.
Mas parece-me também, e dentro dos ínfimos limites que nos condicionam no espaço e no tempo, que Pitágoras tinha razão quando afirmava “ser o homem a medida de todas as coisas”. É notável como este filósofo e matemático grego do século VI AC, ao formular esta ideia, teve uma noção da relatividade que caracteriza o Universo, para mais se atendermos aos limitadíssimos conhecimentos da sua época. E, assim, se compararmos o saber desses tempos antigos com o actual, muito, muitíssimo mesmo, a Humanidade aprendeu à sua custa, com os inevitáveis avanços e recuos, mas com os primeiros a desenvolverem-se de uma maneira extraordinária a partir da chamada Revolução Industrial, iniciada nos princípios do século XIX, e para a qual teve a maior importância a invenção da máquina a vapor, devida entre muitos outros, a Papin, Potter e Stevenson, homens cuja "profissão" era experimentar, aprender e fazer. E acabámos por chegar à Lua, esse grãozinho de pó que gira à volta de um grão um pouco maior chamado Terra.
Porém, e como a dualidade de pólos opostos é a lei do mundo que conhecemos, toda a medalha tem o seu reverso. Fleming, por exemplo, ao descobrir a penicilina e abrindo o caminho para os antibióticos que se seguiram, provocou um enorme desastre ecológico, desencadeando a destruição de bactérias patogénicas que deviam matar não só os humanos como outras espécies que partilham connosco o enigma da vida neste e, possivelmente, em muitos outros planetas além do sistema solar. Também o desenvolvimento vertiginoso da cirurgia e dos medicamentos contribuíram para a longevidade da espécie humana e consequente explosão demográfica que já começou a extinguir outras espécies, tanto animais como vegetais, e essenciais para o equilíbrio ecológico. Pergunto, embora me considere um pacifista, se já não estaríamos a devorarmo-nos uns aos outros, se não continuasse a haver guerras que, no século passado, e também graças ao desenvolvimento da ciência, possivelmente mataram mais seres humanos do que em épocas anteriores, nas quais às guerras se juntavam as epidemias e outras catástrofes naturais que faziam o seu “trabalho de limpeza” eliminando os menos aptos. Porque não tenhamos dúvidas: a vida tal como a conhecemos é escrava da selecção natural, desde o único espermatozóide que entre centenas de milhões consegue chegar ao óvulo, passando pelo macho mais forte ou dotado que derrota o mais fraco para ser ele a copular, até ao homem que vence na vida pela força, inteligência ou esperteza. E mais além, e até porque “somos a medida de todas coisas”, fica o macrocosmos que julgamos conhecer só porque enxergamos uns milhões de galáxias pelos diversos instrumentos de observação astronómica.
Mas lutar por todos os meios pelo prolongamento da vida está presente em cada ser, animal ou vegetal, o que põe sempre a problemática do porquê e para quê. Por sua vez aquela coloca-nos entre a simples explicação de puras reacções químicas, que basicamente nada explicam, e o nebuloso mundo da metafísica onde cada qual pode ver o que quer, até tudo o que lá não está, com o mesmo resultado: a velha interrogação sobre o que apareceu primeiro, o ovo ou a galinha. De tudo isto vem o meu agnosticismo perante a criação de tudo o que existe, mesmo considerando que o chamado “big-bang” pode explicar a origem do Universo tal como hoje o conhecemos, mas não diz como surgiu a primeira partícula que lhe deu origem.
Ora e porque sendo agnóstico recuso a ideia de falar sobre a hipótese de um Deus criador, e até porque ao sabor do prazer de “filosofar” costumo perder o fio à meada, vou regressar ao título deste texto, pedindo desculpa pela diversão (perdão, “faits-divers”). Mas onde é que já ouvi isto? Não me digam que também estou a adquirir o vício de usar e abusar de palavras estrangeiras sem necessidade. Espero que isso nunca me aconteça (perdão, “jamais”, "jamais”!!!). Outra vez!? Bem. Vou fazer uma pausa como acto de contrição. “Deo gratias”!
Continuando:
Sendo o Homem o rei da Natureza pelo direito do bacamarte (in “Eusébio Macário” de Camilo Castelo Branco), poderia, de vez em quando, dedicar-se a aprender alguma coisa quando põe aquele de parte. (Esta rima saiu-me improvisada. Talvez tenha dotes poéticos nalgum recôndito sítio do meu já envelhecido cérebro.)
Ora, e citando a antiga máxima que o saber não ocupa lugar, volto a insistir que seria bom que tradutores, jornalistas e todos os que fazem da comunicação entre as pessoas uma profissão, investigassem os assuntos que desconhecem ou têm dúvidas, afim de não transformarem o disparate numa bola de neve que só serve para propagar a ignorância por este ditoso planeta, até porque quem conta um conto acrescenta um ponto, contribuindo deste modo para a chamada tendência universal da asneira.
É óbvio que errar é humano, mas há situações que se tornam imperdoáveis pela falta de cuidado posta na investigação daquilo que não se sabe, porque ninguém pode saber tudo.

Nem de propósito! Acabo de fazer um intervalo e estive a ver um programa sobre a Lua num dos meus canais de televisão favoritos: Discovery. Não fixei o nome da empresa tradutora, mas era mais um a juntar a tantas que aparecem como formigas. A certa altura surgiu na legendagem uma referência a graus “Calvin!” em vez de Kelvin, o que revela a falta de interesse em aprender e cumprir o dever de bem informar do tradutor. E isto numa época em que temos o precioso e fácil auxílio de uma coisa chamada Internet! Permitam-me então que seja eu a explicar porque, como já disse num artigo anterior, gosto muito de aprender mas também de ensinar.
A temperatura mede-se na maior parte dos países na escala de Anders Celsius , astrónomo e físico sueco do Século XVIII, inventor da escala que tem o seu nome. Já os povos anglo-saxónicos utilizam geralmente a escala de Daniel Fahrenheit (1686-1736) físico alemão que criou a escala também baptizada com o seu nome.
A primeira tem como extremos os pontos de fusão e ebulição da água sob a pressão atmosférica de 760 milímetros de mercúrio, e está dividida em cem graus, (de zero a cem) sendo por isso também chamada centígrada.
A segunda encontra-se também dividida entre os mesmos fenómenos físicos, mas na razão de 1/180, o que dá como resultado que zero graus na escala de Célsius correspondam a 32 graus Fahrenheit e cem a 212. Para converter uma na outra basta resolver as equações: C=5/9 (F-32) ou F=9/5 C+32, em que "C "representa graus Celsius e "F" graus Fahrenheit. Se não quisermos puxar pela cabeça, o que é muito mau, ou se já tivermos esquecido equações, o que é de aceitar, basta consultar uma tabela de conversões.
Quanto á escala de William Thomson Kelvin, físico britânico do século XIX, trata-se da chamada escala absoluta ou do zero absoluto, uma vez que é praticamente impossível fazer descer mais a temperatura de um corpo. Corresponde a 273,15 graus negativos na escala de Célsius e, tal como esta, divide-se em fracções iguais. Fui suficientemente claro? Assim espero, tanto como desejo não voltar a ler Calvin!
E por hoje fico por aqui. Como sempre alonguei-me demasiado, crítica muito pertinente feita por um grande amigo, o mesmo que, tal como eu, andou na Guerra Colonial e que agradecia os pedidos de protecção que a mãe fazia ao chamado Criador, respondendo que como tinha “cunhas” lá ia escapando; os que não tinham é que se “lixavam”.
Para a próxima, e mantendo como base o título deste texto, vou dissertar um pouco sobre pleonasmos, prometendo mas não jurando, que não me alongarei tanto. E não juro porque sinto que escrever muito desintoxica-me o fígado, às vezes agredido por umas cervejinhas a mais (ou a menos). Também acho que puxar pela cabeça dentro do seu ritmo natural talvez possa prevenir a doença de Alzheimer, esse estranho mal que ataca o cérebro, talvez gasto pelo esforço inglório de tentar equacionar tantos disparates, para os quais o meu também contribuiu, como é lógico. Assim o espero.



02/03/2010

A MANIA DO GLOBAL E DO TERRENO PEGOU, MESMO SOBRE A ÁGUA

A MANIA DO GLOBAL E DO TERRENO PEGOU, MESMO SOBRE A ÁGUA.

MAS O QUE É VERDADEIRAMENTE GRAVE É O USO E ABUSO DE TERMOS E PALAVRAS INGLESAS. E VIVA A PIRATARIA LINGUÍSTICA, E NÃO SÓ (MAS TAMBÉM…)

Num dos artigos deste “blogue” comentei que, tal como os vírus, é espantoso como certas expressões ou palavras, uma vez surgidas da boca de alguém, vindas neste caso dos anglicismos “in the ground” e “global”, logo se tornam epidémicas, transformando as pessoas em autênticos papagaios, sem ofensa a estes, é claro.


O último exemplo mais notório veio da boca do comandante português da força naval que se encontra no oceano Índico para combater (será mesmo?) os piratas somalis. Segundo ele os navios continuavam no terreno para o referido efeito. Ao ouvir isto lembrei-me do filme “O Grande Elias”, onde o actor Estêvão Amarante, referindo-se à fábrica de loiças da Marinha Grande, lhe chama a marinha terrestre.
E, já que falámos de piratas, vou desviar-me um pouco do assunto inicial. Será normal e aceitável que a comunidade internacional (perdão, global) gaste milhões com navios de guerra para combater uns bandidos que, em três ou quatro lanchas, mesmo que estejam bem armados, conseguem sequestrar navios de centenas ou milhares de toneladas e muitos metros de altura? Mas em que mundo é que estamos? Não seria muito mais simples permitir o uso de armas aos comandantes das embarcações visadas, cujo dever é defender os seus navios, passageiros, tripulantes e carga, e que se encontram impedidos de fazê-lo? Após uma descarga de aviso, se esta não resultasse, o que é pouco provável, a única solução seria atirar a matar, ao mesmo tempo que as lanchas seriam furadas e, consequentemente, afundadas. É devido a esta impunidade que as coisas chegaram ao ponto em que se encontram, com os contribuintes e honestos habitantes deste planeta (perdão, globo) a pagar esta palhaçada. Então por que não fazê-lo? Serei eu que estou a ver as coisas de um modo simplista?
Mas que estúpido sou! Esqueci-me que existe um diploma chamado Declaração dos Direitos Humanos, com o qual, aliás, concordo plenamente. Mas o problema reside no facto de também proteger os maiores facínoras deste mundo. Por isso sempre considerei que alguns pontos desse diploma não deveriam ser aplicados a quem o violasse, apesar de contrariar os puros ideais de algumas pessoas que Fernando Pessoa tão bem classificou como “amigos de gente”. Até já houve um deputado da chamada Câmara dos Lordes de Inglaterra (estranha democracia onde existem Lordes e Comuns) que proclamou que os terroristas também têm direitos! Pela minha parte, e como não sou tão mau como possa parecer, apenas desejo que tanto ele como os seus familiares e amigos nunca sejam vítimas desses criminosos que, mesmo que lutem por causas chamadas justas, perdem logo a razão quando sequestram ou assassinam pessoas entre as quais até podem estar algumas do seu lado, demonstrando assim que estão nas tintas (passe a expressão) para os direitos dos outros. Ou será que neste caso não se trata de crimes contra a Humanidade? Mas deixemos os piratas e o tempo em que foram a alegria do oceano Atlântico, animando as monótonas viagens nos lentos galeões que ligavam a Europa ao Novo Mundo e vice-versa. Como foi possível permitir que essa boa rapaziada, que nem sequer tinha um sindicato com advogado gratuito para a defender, fosse barbaramente enforcada quando era apanhada na sua honesta, respeitável e fatigante faina marítima, fruto do seu sustento, e à qual se dedicava com o máximo profissionalismo, chegando a estripar vivos os que caíam nas suas pobres mãos ou obrigá-los a comer as próprias orelhas depois de cortadas numa inocente cirurgia estética? Um desses pobres diabos, chamado Montbard, por alcunha “O Exterminador”, tinha uma embirração biológica para com os espanhóis. São feitios, como dizia o saudoso Raúl Solnado num dos seus célebres monólogos revisteiros. Se apanhava um dos "nuestros hermanos", abria-lhe a barriga com uma faca, puxava os intestinos para fora, e pregava-o a uma árvore. Depois chegava-lhe um archote aceso ao rabo. É fácil imaginar o espectáculo que, por incrível que pareça, não foi inventado nem utilizado pela também boa gente que passava horas fastidiosas em escuras caves, cumprindo os divinos e sagrados deveres impostos pela Santa Inquisição em nome do seu amantíssimo e misericordioso Deus.
Se houvesse um Sindicato dos Trabalhadores Piratas poderia acontecer que decretasse uma greve à sexta-feira, como é normal os sindicatos fazerem, e assim os navios carregados de ouro e de espanhóis, teriam um cruzeiro com fim-de-semana prolongado. Monótono sim, mas tranquilo.
Voltemos, porém, à vaca fria, termo que gosto de empregar, já que as frases idiomáticas são uma das grandes riquezas de qualquer idioma, mesmo que tenham uma origem obscura como este.
Como há pouco tempo uma amiga e antiga colega da RDP me telefonou para dizer, que qualquer dia temos de andar na rua com um dicionário de inglês-português, afim de percebermos o que vamos vendo e ouvindo pelas ruas deste ditoso País, lembrei-me do que Edite Estrela disse num dos seus antigos programas televisivos a este respeito, e que foi mais ou menos isto: mais grave do que aqueles que usam esses termos por ignorância , são os que o fazem por snobismo, modernismo ou para mostrar os seus conhecimentos de línguas estrangeiras. E, pela minha parte, acrescento que também se trata do nosso infelizmente típico complexo de inferioridade e a respectiva mania de dizer que “lá fora é que tudo é bom”, frase dita até por pessoas que nunca saíram de Portugal. E basta vir um espanhol perguntar a um português qualquer coisa, para logo ouvir como resposta uma espécie de espanholada à portuguesa do género “ma qui carajo, ômbré; ió parlo y intiendo todas las língás del mondo, a coméchar pelo jinêché, paxando pelo arábê e finilando al jinamarquêché. És qué tu, ustédé, ai comprénidô iô? Ou qiérês qui iô espikê in englichê”?
E agora duas pequenas histórias passadas comigo há já bastantes anos.
A primeira ocorreu durante um jantar onde estavam cerca de uma dúzia de pessoas, de vários modos ligadas ao mundo da ópera. Entre elas encontrava-se um italiano há muito residente em Portugal, e que exercia funções no Teatro Nacional de S. Carlos. Como é natural falava e compreendia razoavelmente a língua portuguesa. Num ápice eu e a minha mulher sentimo-nos como se estivéssemos rodeados por um grupo de italianos. Nós éramos os únicos que falavam português! Assim, passado algum tempo e apesar de estarmos agradavelmente com amigos portugueses que partilhavam connosco a paixão pela ópera, inventámos uma desculpa e fomos embora comentando o facto.
A segunda deu-se à saída de um concerto sinfónico. Rodeada por um grupo de pessoas estava a viúva de um célebre maestro português, de naciomalidade francesa, mas há longos anos residente no nosso país. Todos à volta dela falavam francês, o que motivou o seguinte comentário de um colega meu: "esta vive em Portugal há tantos anos e não fala português"; ao que respondi: "fala e compreende perfeitamente. A culpa não é dela mas daqueles que a rodeiam, a começar pelo próprio marido que também falava francês com ela. Mas isso era lá com eles. Lamentável é a "snobeira" desta gente que a rodeia e que quer mostrar-se amável com ela e erudita com os outros".
É óbvio que uma boa parte da responsabilidade pelo uso e abuso de estrangeirismos cabe à Comunicação Social (perdão, dos "media"). E, já agora, aproveito para perguntar a quem saiba como se pronuncia esta estranha palavra, uma vez que para soar "média" necessita de um acento agudo no "e", bem como no "i" no caso de "mídia". Além disso o artigo definido utilizado não concorda com ela em género e número. Até os brasileiros, cuja maioria já não os respeita, (mas isso é lá com eles), utilizam a expressão "a mídia"). Porque será? Que preguiça é esta que infesta a nossa língua e que impede a normalizaçáo dos estrangeirismos?. O resultado poderá ser uma verdadeira cagada, uma vez que o acento agudo de cágado qualquer dia também poderá desaparecer, como já foi proposto.
Mas voltemos novamente à vaca fria. Como ia dizendo cabe à Comunicação Social uma grande parte da responsabilidade neste estado de coisas, já que é ela que, por óbvio dever profissional, tem que “dar a cara”, seja na rádio, na televisão ou na imprensa escrita. Nesta, talvez seja o semanário “Visão” um dos campeões das estrangeiradas, apesar dos protestos de vários leitores de uma revista tão conceituada como é.
Mas, se a dita Comunicação Social que deveria ser a primeira a dar o exemplo, procede a seu bel-prazer, a culpa continua a ser dos Governos que não estabelecem regras, como já afirmei num artigo anterior. No entanto, e como não há liberdade sem lei, não ficaria nada mal que fossem dadas directrizes aos respectivos directores sobre este assunto, não se limitando, no caso da RTP, ao programa de Maria Flor “Cuidado com a Língua” que, finalmente, voltamos a ver numa nova edição já anunciada desde Setembro! As minhas maiores felicitações à autora e seus colaboradores, embora me pareça que alguns jornalistas e apresentadores, tal como fizeram em relação às séries anteriores, não vão dar grande importância aos seus ensinamentos.
Mas, heresia das heresias! Directrizes a interferir na Comunicação Social (perdão, dos "media"). Isso seria censura, e viriam logo os senhores jornalistas cuspir cobras e lagartos para todo o lado, mesmo aqueles que nunca souberam o que isso foi. Podem culpar Salazar e o seu Estado Novo, de muitas coisas, mas o que não podem negar é o seu patriotismo na defesa da nossa língua. Ensinava-se a falar bom português, e os estrangeirismos, na sua maioria, eram proibidos, alguns até de uma maneira que hoje nos parece ridícula, como a obrigatoriedade de dizer ou escrever sobrescrito em vez de envelope. Mas, e como atrás disse, não há liberdade sem lei, e ser um pouco ecléctico é, pelo menos para mim, a única filosofia com alguma lógica. A dificuldade, porém, está em determinar as fronteiras, tão relativas como tudo o que acontece no Universo. Mas para alguns senhores jornalistas, que tudo distorcem e inventam, às vezes é preciso estarmos apenas de um lado da barricada. Para esses chega um tal Alberto João!
Perdoem-me este último comentário mas trata-se apenas duma diversão (perdão, de um “faits divers”). E, já agora, e como amante de banda desenhada, eclareço que já li, reli e espero voltar a ler sempre com o mesmo prazer, todos os álbuns de Tim-Tim em francês. Curiosamente, e que me lembre, só encontrei a expressão “faits divers” no início da primeira prancha de “Le Secret de la Licorne”. Coisas…! Sugiro também, sarcasticamente, que quando se fala de futebol, se passe a chamar à divertida Liga dos Últimos, qualquer coisa parecida com “League of the Last”, para não destoar dessa maravilha que é a “Champions League”.
E por hoje chega. Sem querer entrar no que para algumas pessoas pertence ao domínio da escatologia, em vez de “merda, sou lúcido”, como Fernando Pessoa, sob o heterónimo Álvaro de Campos, escreveu no poema “cruzou por mim, numa rua da Baixa”, grito: Merda, basta de tantos estrangeirismos!
E agora vou tentar dormir metendo os habituais tampões nos ouvidos. Mas não vou contar carneiros. Vou simplesmente contar os anglicismos que me vierem à cabeça. Boa noite a todos! Vou começar!
1-Low coast, 2-fair play, 3-fast food, 4-spread, 5-take away, 6-shopping, 7-timing, 8-hot dog, 9-champions league, 10-stand by, 11-car jacking, 12-home jacking, 13-help phone, 14-footsal, 15-look, 16-off shore, 17-resort, 18-check in, 19-sea life, 20-feedback, 21-over booking, 22-background, 23-call center, 24-know-how, 25.remix, 26-playoff, 27-duty-free, 28-flat, 29-no name boys, 30-carrental, 31-in, 32-on, 33-feeling.......zzzzzzzzzzzzZZZZ…rom…room… rooom… roooom… Ai! O que foi? Estava a ressonar! Mas que pesadelo! Tinha caído nas garras da Santa Inquisição e ia ser torturado afim de confessar o pecado de não aceitar palavras estrangeiras, pelo menos aquelas cuja grafia não tivesse sido adaptada para português. Felizmente foi só um pesadelo. Mas, embora não acredite em sonhos, não terá sido uma espécie de premonição? Oxalá!!!