MAS O QUE É VERDADEIRAMENTE GRAVE É O USO E ABUSO DE TERMOS E PALAVRAS INGLESAS. E VIVA A PIRATARIA LINGUÍSTICA, E NÃO SÓ (MAS TAMBÉM…)
Num dos artigos deste “blogue” comentei que, tal como os vírus, é espantoso como certas expressões ou palavras, uma vez surgidas da boca de alguém, vindas neste caso dos anglicismos “in the ground” e “global”, logo se tornam epidémicas, transformando as pessoas em autênticos papagaios, sem ofensa a estes, é claro.
O último exemplo mais notório veio da boca do comandante português da força naval que se encontra no oceano Índico para combater (será mesmo?) os piratas somalis. Segundo ele os navios continuavam no terreno para o referido efeito. Ao ouvir isto lembrei-me do filme “O Grande Elias”, onde o actor Estêvão Amarante, referindo-se à fábrica de loiças da Marinha Grande, lhe chama a marinha terrestre.
E, já que falámos de piratas, vou desviar-me um pouco do assunto inicial. Será normal e aceitável que a comunidade internacional (perdão, global) gaste milhões com navios de guerra para combater uns bandidos que, em três ou quatro lanchas, mesmo que estejam bem armados, conseguem sequestrar navios de centenas ou milhares de toneladas e muitos metros de altura? Mas em que mundo é que estamos? Não seria muito mais simples permitir o uso de armas aos comandantes das embarcações visadas, cujo dever é defender os seus navios, passageiros, tripulantes e carga, e que se encontram impedidos de fazê-lo? Após uma descarga de aviso, se esta não resultasse, o que é pouco provável, a única solução seria atirar a matar, ao mesmo tempo que as lanchas seriam furadas e, consequentemente, afundadas. É devido a esta impunidade que as coisas chegaram ao ponto em que se encontram, com os contribuintes e honestos habitantes deste planeta (perdão, globo) a pagar esta palhaçada. Então por que não fazê-lo? Serei eu que estou a ver as coisas de um modo simplista?
Mas que estúpido sou! Esqueci-me que existe um diploma chamado Declaração dos Direitos Humanos, com o qual, aliás, concordo plenamente. Mas o problema reside no facto de também proteger os maiores facínoras deste mundo. Por isso sempre considerei que alguns pontos desse diploma não deveriam ser aplicados a quem o violasse, apesar de contrariar os puros ideais de algumas pessoas que Fernando Pessoa tão bem classificou como “amigos de gente”. Até já houve um deputado da chamada Câmara dos Lordes de Inglaterra (estranha democracia onde existem Lordes e Comuns) que proclamou que os terroristas também têm direitos! Pela minha parte, e como não sou tão mau como possa parecer, apenas desejo que tanto ele como os seus familiares e amigos nunca sejam vítimas desses criminosos que, mesmo que lutem por causas chamadas justas, perdem logo a razão quando sequestram ou assassinam pessoas entre as quais até podem estar algumas do seu lado, demonstrando assim que estão nas tintas (passe a expressão) para os direitos dos outros. Ou será que neste caso não se trata de crimes contra a Humanidade? Mas deixemos os piratas e o tempo em que foram a alegria do oceano Atlântico, animando as monótonas viagens nos lentos galeões que ligavam a Europa ao Novo Mundo e vice-versa. Como foi possível permitir que essa boa rapaziada, que nem sequer tinha um sindicato com advogado gratuito para a defender, fosse barbaramente enforcada quando era apanhada na sua honesta, respeitável e fatigante faina marítima, fruto do seu sustento, e à qual se dedicava com o máximo profissionalismo, chegando a estripar vivos os que caíam nas suas pobres mãos ou obrigá-los a comer as próprias orelhas depois de cortadas numa inocente cirurgia estética? Um desses pobres diabos, chamado Montbard, por alcunha “O Exterminador”, tinha uma embirração biológica para com os espanhóis. São feitios, como dizia o saudoso Raúl Solnado num dos seus célebres monólogos revisteiros. Se apanhava um dos "nuestros hermanos", abria-lhe a barriga com uma faca, puxava os intestinos para fora, e pregava-o a uma árvore. Depois chegava-lhe um archote aceso ao rabo. É fácil imaginar o espectáculo que, por incrível que pareça, não foi inventado nem utilizado pela também boa gente que passava horas fastidiosas em escuras caves, cumprindo os divinos e sagrados deveres impostos pela Santa Inquisição em nome do seu amantíssimo e misericordioso Deus.
Se houvesse um Sindicato dos Trabalhadores Piratas poderia acontecer que decretasse uma greve à sexta-feira, como é normal os sindicatos fazerem, e assim os navios carregados de ouro e de espanhóis, teriam um cruzeiro com fim-de-semana prolongado. Monótono sim, mas tranquilo.
Voltemos, porém, à vaca fria, termo que gosto de empregar, já que as frases idiomáticas são uma das grandes riquezas de qualquer idioma, mesmo que tenham uma origem obscura como este.
Como há pouco tempo uma amiga e antiga colega da RDP me telefonou para dizer, que qualquer dia temos de andar na rua com um dicionário de inglês-português, afim de percebermos o que vamos vendo e ouvindo pelas ruas deste ditoso País, lembrei-me do que Edite Estrela disse num dos seus antigos programas televisivos a este respeito, e que foi mais ou menos isto: mais grave do que aqueles que usam esses termos por ignorância , são os que o fazem por snobismo, modernismo ou para mostrar os seus conhecimentos de línguas estrangeiras. E, pela minha parte, acrescento que também se trata do nosso infelizmente típico complexo de inferioridade e a respectiva mania de dizer que “lá fora é que tudo é bom”, frase dita até por pessoas que nunca saíram de Portugal. E basta vir um espanhol perguntar a um português qualquer coisa, para logo ouvir como resposta uma espécie de espanholada à portuguesa do género “ma qui carajo, ômbré; ió parlo y intiendo todas las língás del mondo, a coméchar pelo jinêché, paxando pelo arábê e finilando al jinamarquêché. És qué tu, ustédé, ai comprénidô iô? Ou qiérês qui iô espikê in englichê”?
E agora duas pequenas histórias passadas comigo há já bastantes anos.
A primeira ocorreu durante um jantar onde estavam cerca de uma dúzia de pessoas, de vários modos ligadas ao mundo da ópera. Entre elas encontrava-se um italiano há muito residente em Portugal, e que exercia funções no Teatro Nacional de S. Carlos. Como é natural falava e compreendia razoavelmente a língua portuguesa. Num ápice eu e a minha mulher sentimo-nos como se estivéssemos rodeados por um grupo de italianos. Nós éramos os únicos que falavam português! Assim, passado algum tempo e apesar de estarmos agradavelmente com amigos portugueses que partilhavam connosco a paixão pela ópera, inventámos uma desculpa e fomos embora comentando o facto.
A segunda deu-se à saída de um concerto sinfónico. Rodeada por um grupo de pessoas estava a viúva de um célebre maestro português, de naciomalidade francesa, mas há longos anos residente no nosso país. Todos à volta dela falavam francês, o que motivou o seguinte comentário de um colega meu: "esta vive em Portugal há tantos anos e não fala português"; ao que respondi: "fala e compreende perfeitamente. A culpa não é dela mas daqueles que a rodeiam, a começar pelo próprio marido que também falava francês com ela. Mas isso era lá com eles. Lamentável é a "snobeira" desta gente que a rodeia e que quer mostrar-se amável com ela e erudita com os outros".
É óbvio que uma boa parte da responsabilidade pelo uso e abuso de estrangeirismos cabe à Comunicação Social (perdão, dos "media"). E, já agora, aproveito para perguntar a quem saiba como se pronuncia esta estranha palavra, uma vez que para soar "média" necessita de um acento agudo no "e", bem como no "i" no caso de "mídia". Além disso o artigo definido utilizado não concorda com ela em género e número. Até os brasileiros, cuja maioria já não os respeita, (mas isso é lá com eles), utilizam a expressão "a mídia"). Porque será? Que preguiça é esta que infesta a nossa língua e que impede a normalizaçáo dos estrangeirismos?. O resultado poderá ser uma verdadeira cagada, uma vez que o acento agudo de cágado qualquer dia também poderá desaparecer, como já foi proposto.
Mas voltemos novamente à vaca fria. Como ia dizendo cabe à Comunicação Social uma grande parte da responsabilidade neste estado de coisas, já que é ela que, por óbvio dever profissional, tem que “dar a cara”, seja na rádio, na televisão ou na imprensa escrita. Nesta, talvez seja o semanário “Visão” um dos campeões das estrangeiradas, apesar dos protestos de vários leitores de uma revista tão conceituada como é.
Mas, se a dita Comunicação Social que deveria ser a primeira a dar o exemplo, procede a seu bel-prazer, a culpa continua a ser dos Governos que não estabelecem regras, como já afirmei num artigo anterior. No entanto, e como não há liberdade sem lei, não ficaria nada mal que fossem dadas directrizes aos respectivos directores sobre este assunto, não se limitando, no caso da RTP, ao programa de Maria Flor “Cuidado com a Língua” que, finalmente, voltamos a ver numa nova edição já anunciada desde Setembro! As minhas maiores felicitações à autora e seus colaboradores, embora me pareça que alguns jornalistas e apresentadores, tal como fizeram em relação às séries anteriores, não vão dar grande importância aos seus ensinamentos.
Mas, heresia das heresias! Directrizes a interferir na Comunicação Social (perdão, dos "media"). Isso seria censura, e viriam logo os senhores jornalistas cuspir cobras e lagartos para todo o lado, mesmo aqueles que nunca souberam o que isso foi. Podem culpar Salazar e o seu Estado Novo, de muitas coisas, mas o que não podem negar é o seu patriotismo na defesa da nossa língua. Ensinava-se a falar bom português, e os estrangeirismos, na sua maioria, eram proibidos, alguns até de uma maneira que hoje nos parece ridícula, como a obrigatoriedade de dizer ou escrever sobrescrito em vez de envelope. Mas, e como atrás disse, não há liberdade sem lei, e ser um pouco ecléctico é, pelo menos para mim, a única filosofia com alguma lógica. A dificuldade, porém, está em determinar as fronteiras, tão relativas como tudo o que acontece no Universo. Mas para alguns senhores jornalistas, que tudo distorcem e inventam, às vezes é preciso estarmos apenas de um lado da barricada. Para esses chega um tal Alberto João!
Perdoem-me este último comentário mas trata-se apenas duma diversão (perdão, de um “faits divers”). E, já agora, e como amante de banda desenhada, eclareço que já li, reli e espero voltar a ler sempre com o mesmo prazer, todos os álbuns de Tim-Tim em francês. Curiosamente, e que me lembre, só encontrei a expressão “faits divers” no início da primeira prancha de “Le Secret de la Licorne”. Coisas…! Sugiro também, sarcasticamente, que quando se fala de futebol, se passe a chamar à divertida Liga dos Últimos, qualquer coisa parecida com “League of the Last”, para não destoar dessa maravilha que é a “Champions League”.
E por hoje chega. Sem querer entrar no que para algumas pessoas pertence ao domínio da escatologia, em vez de “merda, sou lúcido”, como Fernando Pessoa, sob o heterónimo Álvaro de Campos, escreveu no poema “cruzou por mim, numa rua da Baixa”, grito: Merda, basta de tantos estrangeirismos!
E agora vou tentar dormir metendo os habituais tampões nos ouvidos. Mas não vou contar carneiros. Vou simplesmente contar os anglicismos que me vierem à cabeça. Boa noite a todos! Vou começar!
1-Low coast, 2-fair play, 3-fast food, 4-spread, 5-take away, 6-shopping, 7-timing, 8-hot dog, 9-champions league, 10-stand by, 11-car jacking, 12-home jacking, 13-help phone, 14-footsal, 15-look, 16-off shore, 17-resort, 18-check in, 19-sea life, 20-feedback, 21-over booking, 22-background, 23-call center, 24-know-how, 25.remix, 26-playoff, 27-duty-free, 28-flat, 29-no name boys, 30-carrental, 31-in, 32-on, 33-feeling.......zzzzzzzzzzzzZZZZ…rom…room… rooom… roooom… Ai! O que foi? Estava a ressonar! Mas que pesadelo! Tinha caído nas garras da Santa Inquisição e ia ser torturado afim de confessar o pecado de não aceitar palavras estrangeiras, pelo menos aquelas cuja grafia não tivesse sido adaptada para português. Felizmente foi só um pesadelo. Mas, embora não acredite em sonhos, não terá sido uma espécie de premonição? Oxalá!!!
Boa,quem fala assim não é gago... Parabéns, fico á espera de mais...
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