23/03/2015

CENSURA OU LIBERDADE DE IMPRENSA? 
O DIABO QUE ESCOLHA!

Confesso que me custa muito pôr esta questão mas, a verdade é que há muito tempo que penso nela. Há dias, porém, ao ver a cena vergonhosa entre aquela cambada de “melgas” e o advogado João Araújo, confesso que a embirração que sinto pela maioria dos jornalistas voltou a dominar-me. Caramba! O homem até foi mal-educado; mas, não terá direito à indignação uma pessoa que não pode sair à rua sem que lhe chovam em cima dezenas de perguntas e lhe barrem a passagem com microfones? Com que direito é que essa gente interroga, fotografa e filma sem perguntar se o visado a isso está disposto?
“Este senhor não compreende a nossa profissão”, é o clássico comentário quando alguém reage mal aos seus ataques, mas não se lembram que os outros podem estar a fazer o mesmo, como foi o caso.
Será que, na pomposamente chamada Escola Superior de Jornalismo, não se ensina que é falta de educação insistir em perguntas quando alguém declara não estar disposto a fazê-lo? Uma das meninas protagonistas daquela triste cena, até teve o arrojo de insistir argumentando que “precisava de saber”!
Com que direito? Nem nos tribunais os réus são obrigados a responder aos juízes.
Agora, dizem que vão processar o advogado. Quem se deve estar a rir é Alberto João Jardim, que não hesitou em classificar de “bastardos, para não lhes chamar filhos da puta”, alguns (note-se) jornalistas do Continente quando estes se meteram com a reforma que ia receber. Ficou com tanto medo das ameaças do presidente do Sindicato dos Jornalistas que, algum tempo depois, até fez uma valente “caralhada” dentro de um autocarro para os chamados media.
Vendedores de um produto chamado notícia, a maioria actua como qualquer comerciante, apenas com uma diferença: o vendedor que tenta impingir fruta de aspecto duvidoso, não corre atrás de nós ou barra-nos o caminho. Quando muito, murmura algumas imprecações e tenta enganar outro.

Mas, há mais. Na ânsia de vender os seus produtos, investigam tudo o que lhes cheira a escândalo ou catástrofe para depois exibirem grandes títulos seguidos de textos onde deturpam, ampliam (nunca o contrário) lançando muitas vezes o pânico entre a população.
Quem não se lembra das vacas loucas e das gripes suína e das aves, para só falar destas? Bastava aparecer uma avezita morta para abrir os telejornais com um jornalista logo enviado para “o terreno”, olhando para o pequeno cadáver desejoso de que a causa da morte fosse a famigerada gripe. Pouco depois já se falava de epidemia! Mas, se a desejada tragédia não se confirmava, o desmentido passava para terceiro plano, como é prática normal entre estes vendedores de tragédias.
“Cinco polícias na casa da morte”, era o título em letras enormes que o “Correio da Manhã” exibia na primeira página há uns tempos atrás. Como frequento um clube que adquire esse jornal, uma vez por outra folheio um exemplar apenas para me divertir com os contumazes cabeçalhos bombásticas.
Daquela vez, porém, fiquei chocado; a notícia referia-se à investigação policial sobre a morte do filho de Judite de Sousa. Francamente! Nem o respeito pela tremenda dor de uma colega de profissão, deteve a ganância de vender. Não lhes chega a exibição a cores de centenas de cus e de mamas, estas curiosamente com uma pudica estrelinha sobre os mamilos, do putedo nacional!
Aquando das obras de alargamento do tabuleiro da ponte chamada “25 de Abril”, um jornal publicou na primeira página uma fotografia tirada de modo a que se visse bem a curvatura côncava que o dito tabuleiro apresentava. Por cima, o título era eloquente: “A ponte deu de si”.
Eu já tinha notado isso face ao desempenho do motor do carro,  habituado à natural convexidade, facto que nunca me preocupou.
No entanto, uma colega sabedora das minhas travessias semanais, teve o cuidado de me avisar do “perigo” que corria.
Embora confiante nos engenheiros responsáveis pela obra, deu-me para ler o texto onde se procurava lançar o pânico entre os utilizadores da ponte.
Numa entrevista a um dos engenheiros, este explicou (para provável desespero do jornalista) que o tabuleiro iria arquear um pouco mais, mas sem atingir os limites de segurança.
Depois de ler, só lamentei o facto de o entrevistado não ter dito: olhe, quando a ponte voltar à posição normal, não se esqueça de publicar uma fotografia e referir-se ao assunto com as mesmas parangonas.

“Palavras cruzadas, perguntas inúteis”, era uma frase omnipresente num divertido programa de rádio do início da minha adolescência. Ainda não havia televisão, e a telefonia estava ligada durante todo o dia. Julgo que era protagonizado por Camilo de Oliveira.
Aquela frase vem-me frequentemente à memória quando oiço as tão idiotas como inúteis interrogações que devem fazer parte do programa de ensino da delirante escola de jornalismo: “Ganhou esta prova; está contente? Porquê?” “Ficou desempregado; isso preocupa-o? Porquê?”
Quando oiço isto, nas poucas vezes que tenho pachorra para aturar um telejornal mais de dez minutos, recordo uma entrevista de uma senhora jornalista a uma menina, amante do desporto, e que, devido a um acidente, tinha ficado paraplégica.
-“Tens pena de não poderes voltar a correr?
-“Tenho!”
-“Porquê?” perguntou a estúpida besta enquanto a mãe, ao lado da filha, em vez de partir a cara àquela profissional da coscuvilhice, esboçava um sorriso de tristeza.

“O que irá acontecer quando a sociedade de consumo chegar à saciedade de consumo?” é o tema de uma das tiras da imortal Mafalda criada por Quino. Quando me lembro disto, chego a ter saudades dos telejornais em que um locutor começava por dizer: “do País”, e lia os papeis que tinha à frente. Depois, anunciava “do Estrangeiro”, e prosseguia na leitura.
Devido às limitações técnicas da época, apenas apareciam as imagens mais relevantes e, como é óbvio, o que a censura autorizara.
Hoje, caindo no extremo oposto, os telejornais abusam do tempo que lhes é concedido, em que cada notícia é apresentada por um jornalista diferente. A maior parte das vezes, nem sequer dá a cara, substituindo-a por imagens que apenas servem para desviar a atenção. Fala-se de um banco, e logo aparece a fachada de uma das agências e gente a levantar dinheiro; fala-se de crise (oiço-a desde que nasci) e vê-se pessoas a passarem nas ruas; e, para quê mais?
Agora que se aproxima a chamada “época de incêndios” lá vamos ter como pano de fundo uma floresta a arder. E, como título, PORTUGAL EM CHAMAS!
Concluindo: censura não! Mas que, por vezes, é necessária, sim! “Cruel dilema”, como diz Vasco Santana em “O Pátio das Cantigas.








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