PANDEMIA INFORMATIVA
Em primeiro lugar volto a pedir desculpa por ainda não ser desta vez que encerro o tema sobre “o maior português”. Salazar que espere.
A razão continua a ser, como é óbvio, o “coronavírus-covid 19” que graças aos telejornais, se não mata, pelo menos mói o sistema nervoso a quem tem pachorra para os ver e, principalmente, ouvir até à exaustão o dueto “coronavírus-covid 19”. Por favor, senhores jornalistas; nós sabemos do que estão a falar e, uma vez por outra, talvez fosse menos indigesto ouvir pandemia, infeção, contagiado, etc. e não o papaguear constante daqueles palavrões.
Se na última publicação referi-me àquele assunto, resolvi juntar-lhe mais três que, de momento, tenho “em cima da mesa” sobre a ânsia de informar, ou melhor, repisar o que se poderia dizer em menos de metade do tempo. Estamos, portanto, sob uma poluição informativa, como referiu a Organização Mundial da Saúde. É óbvio que as tecnologias actuais permitem todo o tipo de enxurradas com que os jornalistas nos encharcam Basta ver o que se passa com o futebol onde os fanáticos por aquele desporto fazem andar para a frente e para trás uma imagem dezenas de vezes, para ver se um jogador tinha a ponta do nariz ou a cabeça do pénis para lá da linha de grande penalidade. Isto se este último estiver erecto, como é lógico. Mas, vamos ao primeiro assunto. Bolas! onde está ele? Ah! Tinha-o “em cima da mesa” e escorregou para o chão, ou melhor, para o “terreno”. Felizmente fê-lo de uma maneira “sustentável”, excepto no que respeita às minhas articulações que se queixaram provocando dores muito pouco “sustentáveis”.
O primeiro caso deu-se no passado dia 28 do mês passado no telejornal da “SIC”. Na ânsia de mostrar uma zaragata entra a polícia e um grupo de londrinos que se recusavam a ficar em casa, a cena até gás lacrimogéneo e “cocktails” Molotov meteu. Até aqui, tudo bem. Uma típica cena “no terreno” da brandura das relações entre polícia e cidadãos num país democrático. Porém, só houve um quid pro quo: é que as imagens datavam do dia onze desse mês! Claro que no fim lá veio um pedido de desculpas, o que é sempre de louvar, mas fica a pergunta: quantas vezes seremos enganados só porque se tem de mostrar e repetir tudo ao pormenor, enfastiando as pessoas com mortos, contaminados, recuperados, quarentenas, hospitais, profissionais de saúde, camas, máscaras, ventiladores ou a sua falta, para além de ruas desertas ou a ponte dita”25 de Abril” com as bichas do costume, se se deve usar máscara ou não, se é a dois ou quatro metros o mínimo a que uma pessoa deve estar de outra, entrevistas com um jornalista de cada lado e imagens continuamente repetidas a passarem ao meio e... porra e mais porra até “em cima da mesa”! Até este parágrafo ficou infectado com a sua extensão. Que diria a minha professora primária se eu lhe apresentasse tamanha lenga-lenga. De certeza que já morreu há muitos anos e, provavelmente, até esteve “em cima da mesa”, neste caso da anatomia para ser autopsiada.
O segundo caso aconteceu quando os Norte-Americanos resolveram invadir o Iraque.
Não me recordo do que estava a fazer naquele momento; só sei que ouvi a voz de José Rodrigues dos Santos a berrar que estavam sirenes a tocar em Bagdade. Claro que como todos os Portugueses fiquei alarmadíssimo, e o que quer que fosse que estava a fazer, larguei logo “em cima da mesa”. Tive medo que, como represália por o senhor Durão Burroso (perdão, Barroso) mais os seus comparsas terem planeado o ataque nos Açores, os Iraquianos disparassem depois uma das armas de destruição maciça com o objectivo de destruir aquelas magníficas esculturas de José Cutileiro que encabeçam o Parque Eduardo VII. Mas, não! Afinal não havia armas nem moles nem maciças e os Portugueses puderam dormir descansados enquanto os Norte-Americanos e companhia arranjavam mais uma bronca de todo o tamanho.
Giro foi ver na “contra-informação” o boneco que representava o jornalista Carlos Fino, que se encontrava em Bagdade a dizer: “o Rodrigues dos Santos: não grites tanto aí em Lisboa senão não consigo ouvir aqui as sirenes!”
O terceiro e último caso remonta aos anos setenta do século passado, durante uma das crises de petróleo que, periodicamente, costumam “estar em cima da mesa”.
Eu tinha chegado pela manhã à Emissora Nacional quando um colega me mostrou a rir o “Diário de Notícias” que, na primeira página, destacava o seguinte título: “O “Século” enfiou o cofió”. (cofió era uma espécie de barrete que a tropa usava no ex-Ultramar Português). O que é que aconteceu, então? No dia anterior o jornal “O Século”, que havia de passar por tantas vicissitudes após o “25 de Abril” até ser extinto em 1977, noticiara que “enquanto se discute em... (não me lembro do local) a crise do petróleo, estão árabes em Lisboa”. E, para não haver dúvidas, exibia uma fotografia com uns tipos vestidos à moda tradicional dos povos árabes sentados à mesa de um restaurante.
A verdade é que desde que fora encontrado petróleo em Cabinda (Angola), Portugal passou a pertencer ao clube dos países exportadores daquele produto. Até constava que Salazar, sempre prudente e desconfiado como era, exclamara anos antes ao saber do êxito das primeiras prospeções: “só nos faltava mais esta desgraça; agora os afro-asiáticos e os russos vão querer apoderar-se dele”.
Mas, e pondo de parte esta possível piada, há que lembrar que o nosso espírito de humor pode ir até às últimas consequências. Foi assim que um grupo de brincalhões endinheirados, entre eles um filho do embaixador de Marrocos, resolveu pregar uma grande partida à imprensa da época. Para isso decidiram ir jantar ao conhecido restaurante “Tavares Rico” no Bairro Alto vestidos com os trajos arranjados pelo marroquino e num carro da embaixada, fizeram a sua entrada no referido bairro, onde um zeloso polícia, ao ver a matrícula “CD”, deixou-os entrar por uma rua de sentido proibido.
Para não haver problemas de comunicação, um dos comparsas declarou que falava português e que, portanto, serviria de intérprete, enquanto os outros inventavam uma “língua” mais ou menos parecida com o árabe.
Pode calcular-se o impacto que semelhantes personagens provocaram no pessoal do restaurante. Solícito, o chefe trouxe a ementa e não sei se também a lista de vinhos, já que os muçulmanos não podem ingerir bebidas alcoólicas.
Assim que foi servido o primeiro prato deu-se uma grande bronca: o “árabe” que fazia de emir provou e, através do “intérprete”, declarou que no seu país aquilo nem aos porcos se dava. E, um a um , todos os pratos foram rejeitados pelo mesmo motivo. Calcule-se a aflição do pessoal do “Tavares Rico” ao ter que lidar com aqueles clientes, pesando para mais o facto de poderem ter gerado um conflito diplomático. Entretanto, cheios de fome, as ilustres personagens contentaram-se com umas fatias de queijo pagando, apesar de tudo, uma grande quantia.
Não sei como acabou a história no restaurante mas, o que se passou com “O Século”, é que foi lamentável. Sem sentido de humor nem de saber perder, o director daquele jornal (o único que caiu na esparrela na ânsia de sensacionalismo que o levou a não confirmar de fonte fidedigna a presença dos tais “árabes”) recusou a oferta de uma avultada quantia para a “Colónia Balnear Infantil” fundada por aquele jornal e que ainda existe. Com o orgulho ferido, resolveu processar judicialmente os brincalhões, em vez de aceitar o donativo que estes, como se fosse um pedido de desculpas, quiseram oferecer. Porém, a decisão do tribunal deve tê-lo deixado fulo: os réus foram todos absolvidos e durante muito tempo muita gente recordou-se que “O “Século enfiou o cofió”!
E, para terminar, uma gracinha que tenho “em cima da mesa” desta vez devida a uma “gralha” (errare humanum est) saída na página de anúncios do “Diário de Notícias” no dia 26 de Junho de 1968. Querem saber o que é? Então procurem no “Google” “COLHÕES DE MOLAS”!
Nota: Agradeço a emenda de qualquer inexactidão existente na história dos árabes em Lisboa uma vez que não possuo o “célebre” exemplar de “O Século”.
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